Eis
os princípios essenciais a ter em conta
no processo de ensino e aprendizagem de uma língua
estrangeira:
a alegria, a ausência de tensão e a máxima
concentração da atenção.
Georgi
Lozanov
Neste
pequeno texto, iremos descrever, resumidamente, os fundamentos,
as principais características e algumas atividades
paradigmáticas de um método eficaz, inovador
e revolucionário de ensino e aprendizagem de
uma língua estrangeira, criado por Georgi Lozanov
e descrito por Jean Lerède: a Sugestopedia, uma
ciência da educação, resultante
da aplicação didática e pedagógica
de uma outra ciência da vida psicológica,
a Sugestologia, fundamentada esta em estudos sobre a
Sugestão.
Sugestão
Se é
verdade que Binet e Bernheim, no início do século
XX tinham já falado, respetivamente, na sugestibilidade
e na sugestão, referindo-se ambos à
aptidão do cérebro para receber ou evocar
ideias, transformando-as em atos e que tudo o que
age sobre o psiquismo é sugestão,
não é menos verdade que, só a partir
dos estudos de Lozanov, nos anos sessenta, se começou
a medir a importância dessa ação
(Saféris, 1978, p.22), constatando, então,
que o meio age sobre o indivíduo por sugestão,
ou seja pela interação entre a atividade
mental inconsciente e o meio (Lozanov, 1983, p.114).
A sugestão é uma característica
do cérebro humano, que tende a transformar em
atos, sentimentos ou estados de consciência duráveis,
qualquer ideia, imagem ou impressão "aceites"
pelo inconsciente. (Lerède, 1980, p.14).
Por isso, Lozanov centra a sua atenção
nos aspetos subliminares presentes na comunicação
do indivíduo com os outros, com os objetos e
com o meio. Porque impercetíveis, esses fenómenos
subliminares manifestam-se no indivíduo de forma
inconsciente, permanecendo, paradoxalmente, bem presentes
na sua vida mental. Poder-se-á dizer que o diálogo
consciente/inconsciente estudado por Lozanov se traduz
no turbilhão interior de imagens, sensações,
desejos, que ocupam permanentemente a nossa atividade
mental. Se tivermos consciência dos fenómenos
subliminares presentes na nossa interação
com os outros e com o meio, esse diálogo interior
torna-se mais profundo e tem inegáveis reflexos
nos nossos esquemas de pensamento e ação.
Para Lozanov, a sugestão está presente
de forma constante, consciente ou inconscientemente,
em todos os domínios da vida social, sobretudo,
no da comunicação com os outros.
Sugestologia
Deve-se ao psiquiatra búlgaro Georgi Lozanov,
fundador do Instituto Sugestológico de Sófia,
em 1966, a criação de uma, então,
nova ciência humana da vida psicológica,
a Sugestologia, assente nos estudos que dirigiu sobre
a qualidade universal da personalidade, uma ciência
das comunicações inconscientes, subliminares,
responsáveis pela ativação das
reservas ou potenciais do ser humano, cujo objeto de
estudo é a personalidade e a sua complexa inter-relação
com o meio ambiente.
Pela ênfase que, segundo
muitos autores, a Sugestologia confere à atividade
mental inconsciente pode ficar-se com a impressão
de que a atividade consciente, racional, crítica,
pragmática e objetiva, comandada pelo lado esquerdo
do cérebro, seja ofuscada pela abordagem subjetiva,
abstrata, intuitiva, mítica, divergente, inconsciente,
subliminar, comandada pelo lado direito do cérebro.
Contrariando esta visão simplista e redutora,
a Sugestologia defende o diálogo consciente/inconsciente,
o objeto luminoso e a sua sombra, expressão escolhida
para dizer que o consciente e o inconsciente são
indissociáveis e trabalham em conjunto e que
a abordagem da realidade é tanto mais eficaz,
quando feita pela totalidade do cérebro, de preferência
pela sua programação sugestiva.
A Sugestologia
pode ser aplicada a todas as formas de aprendizagem:
na formação técnica do pessoal
das empresas públicas e privadas, no ensino de
matérias com forte pendor na memorização
- como é, por exemplo, o caso da medicina e do
teatro -, nos cursos de alfabetização,
nas disciplinas que requeiram o desenvolvimento da personalidade,
da criatividade, do autoconhecimento, em situações
de reeducação, como o trabalho com delinquentes
juvenis ou com crianças sobredotadas, no treino
de atletas, etc. No entanto, foi a aplicação
dos princípios sugestológicos ao ensino
de uma língua estrangeira que mais resultados
concretos proporcionou. Nasceu, então, uma nova
ciência, a Sugestopedia e, com ela, um novo método
de ensino de línguas estrangeiras, o Método
Sugestopédico que viria a ser reconhecido, em
1978 pela Organização das Nações
Unidas para a Educação, Ciência
e Cultura (UNESCO), que recomendou a sua promoção
e difusão, propondo, ao mesmo tempo, um investimento
significativo na formação de professores
capazes de aplicá-lo. Desde então, passou
a ser ensinado no mundo inteiro com grande eficácia
e consequente sucesso.
Sugestopedia
e Método Sugestopédico
Lozanov
propôs-se aplicar alguns princípios sugestológicos
ao ensino, em geral, e ao de línguas estrangeiras,
em particular, criando, para o efeito, uma nova ciência
da educação, a Sugestopedia, que, por
sua vez, deu origem ao Método Sugestopédico
que, sucintamente, vamos descrever.
O Método
Sugestopédico baseia-se na sede de aprender do
estudante, na estimulação rápida
e sem esforço e está organizado de tal
maneira que as funções conscientes e inconscientes,
os aspetos lógicos e os emocionais da aprendizagem
e a ativação das reservas de personalidade
do aprendente estejam presentes na orientação
do ensinante.
No relatório
que elaborou para a UNESCO, em 1978, Lozanov defende,
por um lado, que a educação, o ensino
e o desenvolvimento pessoal deveriam ser considerados
uma só realidade e, por outro lado, que
não se deve dissociar o processo de comunicação
dos conteúdos de ensino; pelo contrário,
estes estão intimamente relacionados com aquele:
Há que observar com cuidadoso rigor as consequências
positivas e negativas que tem a linguagem utilizada
pelo animador e os comportamentos que adota em relação
aos participantes e à aprendizagem. (Dufeu,
1996, p. 69).
Alguns
aspetos que se encontram presentes em muitos métodos
ativos de ensino de línguas tais como os que
privilegiam a expressão, a abordagem comunicativa,
as componentes culturais e artísticas, etc. são
reforçados com a aplicação dos
princípios específicos do Método
Sugestopédico, assim como a implicação
de cada participante na sua globalidade cognitiva, afetiva
e psicomotora. Mas o que verdadeiramente distingue o
Método Sugestopédico dos outros métodos
é o facto de conferir uma especial atenção
ao psiquismo profundo do indivíduo em formação
- uma espécie de zona de sombra onde se jogam
os sucessos ou fracassos na aprendizagem de uma língua
estrangeira – e de promover a alegria, a ausência
de tensão, a unidade do consciente e do inconsciente,
a ativação de reservas da personalidade,
o apelo constante ao desenvolvimento pessoal, à
comunicação subliminar e à interação
sugestiva.
O Método
Sugestopédico aparece ligado ao ensino de uma
língua estrangeira e a sua eficácia é
hoje incontestada: pelo método sugestopédico
os estudantes assimilam, em média, mais de
90% do vocabulário, que compreende 2000 unidades
lexicais por cada curso de 96 horas; mais de 60% do
vocabulário novo é utilizado ativamente
e de maneira fluída na conversação
de todos os dias e o resto do vocabulário é
apreendido através da tradução;
os estudantes exprimem-se tendo em conta a gramática
fundamental e podem ler qualquer texto (Lozanov,
1978, pp.321-322). Temos verificado, nas atividades
sugestopédicas que temos proposto aos nossos
estudantes que, pelo Método Sugestopédico,
eles aprendem mais depressa e melhor do que por métodos
tradicionais e quando se submetem a testes gerais de
avaliação têm melhores resultados,
tanto nas produções escritas como nas
orais. As relações que os estudantes estabelecem
entre si nas aulas prolongam-se no universo académico
e no das relações sociais em geral, nomeadamente
em atos de solidariedade, camaradagem e amizade, entre
outros.
Lozanov,
partindo do princípio que a tensão extenuante
e, por vezes, angustiante verificada na maior parte
das práticas pedagógicas provém,
muitas vezes, da insegurança do estudante, da
falta de confiança nas suas capacidades de compreensão,
de memorização e de utilização
da informação nova que lhe é fornecida,
identificou três tipos de bloqueios ou barreiras
que o adulto constrói ao longo do seu percurso
existencial e que se tornam obstáculos maiores
à aprendizagem em geral e à aprendizagem
de uma língua estrangeira em particular: as barreiras
lógicas, que se expressam por pensamentos pessimistas
e que só à primeira vista parecem lógicos
(Como é possível aprender 50 novas
palavras em 15 minutos? Aprender é uma
coisa sempre muito difícil e complicada que exige
muito tempo!); as barreiras afetivas que se traduzem,
muitas vezes, pela falta de confiança em si próprio
(Não tenho jeito nenhum para aprender línguas!
Não consigo fazer isso! Sou inibido!) e
as barreiras éticas que consistem nos valores
adotados pelo indivíduo e que contrastam ou conflituam
com os dos outros, nomeadamente, sobre a conceção
do mundo e do homem (Sou por um Quebeque livre versus
Somos por um Canadá unido e inteiro; Os Muçulmanos
ameaçam o Ocidente versus há que distinguir
os radicais terroristas dos muçulmanos moderados
e pacíficos). Ao considerar que as várias
barreiras, obstáculos ou bloqueios dificultam
ou paralisam a aprendizagem, Lozanov propõe que
se faça um trabalho no sentido de removê-los
ou atenuá-los.
A importância
em redescobrir a alegria e o prazer de aprender, num
ambiente sem tensões e sem contrariedades, é
uma preocupação permanente e dominante
do Método Sugestopédico, que se baseia
na sede de aprender do estudante e na rápida
aquisição de competências não
só linguísticas como comunicativas e,
neste contexto, preconiza uma grande concentração
da atenção e, paradoxalmente, uma ausência
de esforço e sofrimento. Com efeito, ao estudar
a forma como as múltiplas solicitações
do meio ambiente atuam sobre o psiquismo de forma inconsciente,
Lozanov propõe a utilização de
três tipos de meios no processo de ensino/aprendizagem
de uma língua estrangeira: psicológicos,
didáticos e artísticos. A sua principal
preocupação é restituir ao aprendente
a confiança em si próprio e proporcionar-lhe
o conhecimento dos seus bloqueios interiores, bem assim
as causas que os provocaram e, a partir daí,
por meios simultaneamente globais e sintéticos,
facilitar a aprendizagem da língua, recorrendo
a canções, filmes, peças de teatro,
suscetíveis de motivarem intensamente os participantes
para a aprendizagem de noções elementares
da língua estrangeira que estão a aprender.
O Método Sugestopédico reconhece a necessidade
de um bom ambiente e de um clima descontraído,
coloca a ênfase na sugestão e na comunicação,
considera importante a remoção das barreiras
de ordem intelectual, afetiva e ética à
aprendizagem da língua e suscetíveis de
dificultar a aprendizagem, sugere a transformação
das associações negativas ligadas a experiências
de aprendizagem anteriores, confere uma significativa
importância aos fatores subliminares que influenciam
a perceção global e defende uma perspetiva
de Educação pela Arte para o desenvolvimento
pessoal e cultural dos participantes, promovendo, ao
mesmo tempo, a acuidade sensorial e a sensibilidade.
O
Professor Sugestopeda
Muitos
professores universitários e responsáveis
de programas de cursos de línguas têm revelado
uma alegre facilidade na utilização de
técnicas oriundas da Sugestopedia, ao mesmo tempo
que demonstram uma extrema dificuldade em compreender
os seus fundamentos, isto é, perceber que o ensino
sugestopédico exige um conhecimento aprofundado
e refletido dos fundamentos psicológicos, fisiológicos,
didáticos, artísticos, etc. que dele fazem
parte. Por outro lado, outros, em sentido inverso, parecem
esquecer-se de que a teoria não é sinónimo
de abstração, sem relação
alguma com as realidades pedagógicas e desenvolvem
sem nuances e com tranquila ignorância, longas
dissertações sobre o método, sem
terem em conta a sala de aulas onde o mesmo se aplica.
É sempre atraente a utilização
de determinadas atividades, geralmente definidas como
informais - técnicas de trabalho de grupo, jogo
de papéis etc., - que muitas vezes os professores
não compreendem na sua essência e se as
utilizam é com o folclórico objetivo de
conferir uma animação a um ensino que
não tem alma.
Aos professores
sugestopedas que ele próprio formou, Lozanov
pedia que se comportassem como atletas da afetividade,
criassem um ambiente descontraído, promovessem
uma relação empática e compreensiva,
adequassem o seu estilo de comunicação,
estivessem sempre em forma e com sede de comunicação,
começassem e acabassem uma aula pontualmente,
adotassem uma atitude solene durante a aula, mantivessem
um tom emocional e autenticamente entusiasta, se concentrassem
na forma de dizer e sugerir o que verdadeiramente cada
estudante deseja aprender, criassem material didático
específico, único e inovador (conceção
de fichas, pastas, arcas e caixas), de acordo com as
competências globais (compreensão e expressão)
e específicas (fonológicas, lexicais e
gramaticais) visadas em cada aula.
A formação
que tem de ter um professor sugestopeda para que desempenhe
os vários papéis que nas aulas lhe são
exigidos é significativamente eclética:
professor, psicólogo, animador de grupo, psicoterapeuta,
ator, artista, etc. Pudemos identificar nas aulas de
Jean Lerède, a que tivemos o privilégio
de assistir, esse desempenho de homem-orquestra, por
parte do professor.
Como se
pode deduzir, não chega uma vida inteira para
formar professores sugestopedas, desde logo pelo facto
de serem utilizadas técnicas subjetivas que contrastam
com as técnicas objetivas desenvolvidas numa
formação clássica de professores
de línguas e, depois, porque a sugestopedia encerra,
em si mesma, a missão de abanar as normas sociais
habituais de aprendizagem de uma língua.
Conclusão:
Críticas e Limites à Sugestopedia e ao
Anti-Método Sugestopédico
Considerado
um pouco por todo o mundo como um método revolucionário,
com resultados miraculosos, a Sugestopedia foi a abordagem
escolhida para o ensino de línguas estrangeiras
por companhias de aviação, empresários,
espiões, militares, políticos, enfim,
todos quantos necessitavam de aprender uma língua
em muito pouco tempo e de modo a poderem utilizá-la
nas suas lides comerciais, políticas, académicas,
investigativas, etc.
Em todos
os sítios, onde se viu aplicada, a Sugestopedia
proporcionou os melhores resultados. Talvez porque a
publicidade à eficácia do método
fosse de tal modo extravagante e as expectativas fossem
demasiado grandes, o método sugestopédico
tem sido alvo de inúmeras críticas que,
em boa verdade, podem ser colocadas a qualquer método
de ensino e aprendizagem de uma língua estrangeira:
em grupos de doze estudantes, tirando uma ou duas
exceções, estes exprimem-se com à
vontade, sem timidez ou inibições de qualquer
espécie, mas com muitos erros de construção
de frases e de gramática e com um sotaque que
em, regra geral, é satisfatório. Estes
resultados não são decisivos, contrariando
um pouco o que alguns tentam vender, tomando os seus
desejos por realidades já adquiridas...
(Lerède, 1980, pp.244-245).
Surpreendentemente,
nas escolas de línguas e universidades, o método
sugestopédico ficou à porta, apesar de
se ter provado cientificamente ser um método
em que se aprende dez vezes mais em dez vezes menos
tempo. Acusado pelos professores de manipulação,
esoterismo e ausência de rigor científico,
mais uma vez as escolas e as instituições
universitárias ocuparam a última carruagem
do progresso científico, quando deviam ter sido
a locomotiva. Mas a razão principal talvez seja
a falta de preparação dos professores,
cuja formação é ainda muito livresca
e desmunida de instrumentos que permitam aos docentes
intervir eficazmente no domínio da comunicação.
Considerada como uma espécie de estalagem espanhola,
em que cada um nela encontra o que traz consigo, os
universitários, sentiram-se e sentem-se de mãos
a abanar, relativamente a uma abordagem sugestopédica
de uma língua estrangeira, talvez porque esta
lhes exija uma grande preparação interior
e uma disponibilidade total.
Não
queremos com isto dizer que não encontremos,
no método sugestopédico, incoerências,
contradições, coisas incompletas e até
situações que representam um certo perigo.
O que não podemos aceitar é essa sempiterna
resistência das instituições académicas,
que, aliás, se podem estender a qualquer outro
método não-convencional de ensino e aprendizagem
de uma língua estrangeira.
Hoje,
o método sugestopédico é muito
menos desenvolvido do que nos anos 60, quando foi criado
e podemos até considerá-lo ultrapassado
por muitas outras abordagens que, entretanto, apareceram,
mas muitos dos seus fundamentos mantêm-se atuais,
alguns deles adotados por novos modelos, entre eles,
o que nós construímos, Método
de ComunicAção para o Ensino de Português
Língua Estrangeira. Ler Mais: Exemplos
de Atividades Sugestopédicas
Referências
Bibliográficas