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Q u e s t ã o
Como todas as línguas, o Português enfrenta o problema da penetração do idioma estrangeiro, problema que varia de importância com, entre outras coisas, a realidade social dos países que a têm como língua oficial. Ainda que, tendo em conta que defender o idioma não é imunizá-lo dos contributos e incorporações necessários à sua renovação, a língua portuguesa padece actualmente do excesso de estrangeirismos e do relaxamento das normas para inclusão de palavras e expressões no vocabulário. Exemplifique com situações concretas os excessos referidos e aponte a forma de evitá-los.


R e s p o s t a


Adoptemos uma posição de bom senso entre os dois extremos em que muitas vezes se debate este problema da nossa língua, de todas as línguas. De um dos lados os laxistas que tudo permitem, deixando entrar livremente todo o tipo de estrangeirismos a maior partes das vezes desnecessários e na maneira como aceitam neologismos, sem mesmo os aconchegar nas suas mantas, como noz diz, Jorge Silva Melo. Do outro lado os polícias da língua e da gramática que, a pretexto de impedirem a invasão dos termos espúrios e antiportugueses oriundos do inglês e do francês apresentam estas maravilhas de delirante ridículo: dizer em vez de montra, escaparate ( que rima, lindamente, com disparate), em vez de Cambridge, Cantabrígia, ou evitar Oxford para referir Oxónia, para já não seguir o seu conselho de, em vez de pedir uma pizza, pedir um disco de massa com molho de tomate e queijo. Não se trata pois, de negar a influência do vocabulário de uma língua numa outra como é, por exemplo o caso da integração de 400 palavras portuguesas no léxico japonês.

São inúmeras as influências de outras línguas na língua portuguesa. Da presença muçulmana na antiga Lusitânia, herdamos centenas de palavras, como arroz, açúcar, azeite, alfândega, almirante, refém e oxalá, da germânica, em especial suevos e visigodos, recebemos guerra, espiar, roubar, estaca, ganso, luva, trégua e, mais recentemente, balcão, blindar, bordar, assim como numerosos nomes de pessoas e lugares, a exemplo de Fernando, Rodrigo, Álvaro, Gonçalo, Guimarães e muitos outros. E isto sem referir ao muitos e diversificados termos que importámos do francês, inglês, italiano, chinês, muitos outros termos. E que dizer da presença índia e africana na língua portuguesa, responsável pela modificação na pronúncia e no léxico português. Por meio da língua geral, o tupi transmitiu ao português numerosas palavras, ainda hoje correntes - abacaxi, arapuca, caipira, caraíba, guariba, jacaré, cambembe -, além de nomear quase toda a fauna. Algumas são música para os ouvidos, como o verbo cutucar e o substantivo sambaqui que designa os sítios arqueológicos do litoral. Os escravos, por seu turno, contribuíram com palavras e expressões como batuque, caçula, cafuné, fulo, maxixe, mocambo, moleque, samba e, para não nos esquecermos da escravidão e das lutas dos negros, sabalangá, senzala e quilombo. São palavras amenas, suaves de agradar o céu-da-boca.

Quando Pombal decretou a obrigatoriedade do uso do português no Brasil, os falantes brasileiros já haviam incorporado diversas palavras de origem indígena e africana no seu vocabulário, como os nomes de plantas, frutas e animais brasileiros oriundos do tupinambá: abacaxi, araticum, buriti, caatinga, caju, capim, capivara, carnaúba, cipó, cupim, curió, ipê, imbuia, jaboticaba, jacarandá, mandacaru, mandioca, maracujá, piranha, quati, sucuri e tatu. A toponímia, ciência que estuda a origem dos nomes de lugares, também revela um grande número de palavras indígenas na fala do brasileiro: Aracaju, Avaí, Caraguatatuba, Guanabara, Guaporé, Jabaquara, Jacarépaguá, Jundiaí, Parati, Piracicaba, Tijuca, etc. A influência indígena também acabou por propiciar a criação de expressões idiomáticas, como "andar na pindaíba" e "estar de tocaia", que são marcas linguísticas de uma cultura específica.

Os africanos do grupo banto e ioruba deixaram um legado próprio na cultura do nosso país. A culinária afro-brasileira tem o abará, o acarajé e o vatapá; e o candomblé tem orixá, exú, oxossi, iansã. O quimbundo, língua falada em Angola, emprestou ao português do Brasil palavras do vocabulário familiar, como caçula, cafuné, molambo e moleque. Termos que expressavam o modo de vida e as danças dos escravos, como senzala, maxixe e samba, também se incorporaram no nosso léxico.

Mau grado o que acabámos de referir sobre as naturais influências de uma língua noutra, não vemos razão alguma para importar termos que facilmente poderiam ser traduzidos ou aportuguesados:

Porquê pedir uma coca-light geladinha depois de uma delivery no drugstore. Enquanto se vai comprar um mouse (que se pronuncia mausi) sem fio para o laptop. Que razão nos leva a dizer que enviamos um e-mail em vez de um correio electrónico? Por que razão fazemos ou ligámos um link, em vez de tão somente estabelecermos uma ligação? Onde estavam as pessoas individuais e colectivas responsáveis pela preservação da língua quando os termos técnicos e tecnológicos começaram a entrar pela janela escancarada da nossa língua sem nenhuma vigilância. A fazer acordos ortográficos tão desnecessários quanto absurdos? Melhor fora que...

Em suma, os estrangeirismos que representam realidades exteriores às realidades culturais lusófonas não ameaçam e, pelo contrário, até enriquecem a língua portuguesa.