É difícil,
numa figura humana, política, social, artística,
económica e, até literária, como é
vista Manuela
Aguiar por aqueles que tiveram o privilégio
de com ela contactar, acreditar na sua partida da vida política
activa. Um retiro, local para onde os descendentes de Viriato,
muitas vezes querem remeter figuras incómodas, que
configuram uma postura independente, não-alinhada e,
sacrilégio maior, pensam pela sua própria cabeça,
descarrilando vezes de mais, das correias de transmissão
do partido a que pertencem.
É
quase consensual ter sido Manuela Aguiar a conseguir a mais
significativa actuação, quer como Secretária
de Estado da Emigração, quer como deputada pelo
círculo da emigração, nas várias
localidades deste país da América do Norte,
em particular e por todo o reino da Emigrolândia, em
geral.
E ela cá esteve, de novo, desta feita, para lançar
um livro que reúne documentos que testemunham a sua
permanente batalha em prol das comunidades portuguesas espalhadas
pelo mundo: No Círculo da Emigração.
Na última quinta-feira, dia 6 de Janeiro de 2005, na
sala multiusos do Consulado-Geral de Portugal em Montreal,
no círculo restrito dos órgãos de informação
deste círculo da emigração portuguesa
que acaba de comemorar o seu cinquentenário. Incansável,
com uma energia bastante superior à que demonstrou
na anterior visita a Montreal, Manuela Aguiar foi questionada
sobre a sua
anunciada retirada. Uma resposta simples e imediata: - Não,
eu não me retiro de coisa nenhuma. Eu apenas saio do
Parlamento, o que, afinal, é muito pouca coisa.
Manuela
Aguiar decide, fazer perguntas que ninguém colocou,
apesar do bombardeamento de questões a que foi submetida
pelos jornalistas da diáspora:
- O que falta para que se consiga fazer uma Federação
Internacional das Comunidades Portuguesas Espalhadas pelo
Mundo? Se ninguém perguntou, naturalmente, ninguém
se mobilizou para responder a este apelo à unidade,
cooperação e solidariedade. –
É uma iniciativa que muitas comunidades de polacos,
italianos, romenos, gregos, etc., têm levado a cabo,
estranhando-se que as associações portuguesas
não sigam a ideia de criar uma Federação
Internacional que tanta falta faria para articular iniciativas,
desenvolver projectos de cooperação, etc. Mas
é a trica política
- lá como cá- que
mobiliza os lusos para o debate. É que Manuela Aguiar,
com as questões que coloca, politicamente incorrectas,
insiste numa série de medidas ameaçadoras para
alguns reumatismos que habitam a comunidade portuguesa de
Montreal em particular e as comunidades portuguesas, na sua
generalidade.
Manuela
Aguiar demonstra uma certa incompreensão, ou mesmo
desespero, pelo abandono de mulheres de todos os partidos
que muito ajudaram à construção de uma
estranha forma de fazer política e intervir
socialmente. Sente-se, por ventura, incompreendida quando
olha para cada um dos presentes e percebe o desfile de olhares
que se escondem por detrás de cada cumplicidade com
aqueles que julgam que a diferença que marcou (e esperamos
que continue ainda a marcar) um outro modo de ver as coisas,
foi derrotado pela cartilha de compressão
de obediências, que o politicamente
correcto quis e quer impor. Com efeito, Manuela Aguiar tem
um pensamento límpido, obsessivo e grávido de
coerência que compagina dificilmente com o alinhamento
que se espera de um político, geralmente, o oposto
disso mesmo.
Respira-se
outro ambiente na sala multiusos do Consulado-Geral de Portugal,
ambiente a que não será alheia a postura discreta,
mas empenhada, disponível, experiente e humorada do
novo cônsul-geral de Portugal, cuja curiosidade pelas
pequenas e grandes coisas também não cessa de
espantar quem a tal não está habituado na diplomacia
portuguesa. Faz-nos falta, a dinâmica presença
da Maria Luísa Fernandes que, temos a certeza de que,
num contexto destes, se sentiria como peixe na água.
Admiramos
a extrema paciência que detém, a nossa deputada
e Secretária de Estado, como muita gente de todos os
quadrantes políticos gosta de chamar-lhe aqui em Montreal,
para, com a pinderiquice lamecha de alguns representantes
de um Portugal queixinhas, trajado de pobreza franciscana,
que se esgueiram da varanda da hipocrisia, sempre a verter
lágrimas de crocodilo, penduradas da algibeira oportunista.
Manuela
Aguiar, entende Portugal como uma nação de comunidades
e, quanto a nós, entende aquilo que, afinal, de Portugal,
se espera, porque, foi esse sempre o grandioso, misterioso
e glorioso significado que tem e que sempre teve como Nação
do V Império visionário de Pessoa ou religioso
do Padre António Vieira ou mesmo profético do
sapateiro Bandarra. Isso mesmo leva um número crescente
de estudantes universitários, luso-descendentes ou
estrangeiros a estudar a língua de Camões e
a cultura lusitana.
Foi nesse
sentido que dois estudantes do programa de Mineur en langue
portugaise et cultures lusophones da Universidade de
Montreal, acompanharam o docente
de língua portuguesa, Luís Aguilar,
a este encontro: o Mário
Conde, de origem galega e a Corinne
Descombes uma gaulesa da Haute-Savoie que
ficaram fascinados, tanto com a deputada Manuela Aguiar como
com o dr.
Carlos Oliveira. Foram acolhidos com simpatia
os estudantes de Português, pelos dois políticos,
num encontro que ficou pautado pela espontaneidade, por uma
dinâmica de troca, de curiosidade e até por um
certo carinho por serem eles aprendentes da nossa cultura
e magna língua.
Nenhum
dos dois representantes de Portugal correspondeu à
imagem que eles têm dos políticos e diplomatas,
pois a deputada manteve um discurso frontal e desprovido de
superioridade e snobismo e o cônsul-geral, constantemente
à procura da novidade e a não faltar a uma possibilidade
de dois dedos de conversa que lhe apeteça.
O livro de Manuela
Aguiar, cujo lançamento serviu de pretexto
para este Encontro informal, mais parecido com uma
tertúlia do que uma conferência de imprensa
como foi alcunhado, apresenta documentos escritos
na primeira ou na terceira pessoas, a actividade parlamentar
da deputada e os percursos percorridos nos tempos
de exercício de funções e de
avidez de comunicação. Nele podemos
encontrar o que escrevíamos
na edição do jornal LusoPresse do dia
1 de Janeiro de 2000, a propoósito do lançamento
do seu livro anterior, Manuela Aguiar. Migrações
sem Fim ( Manuela Aguiar, cita-nos na página
168 deste seu novo livro):
]...[ Os temas abordados durante cerca de duas
horas foram variados, mas com vincada insistência
sobre o problema da nacionalidade. Manuela Aguiar
voltou a esclarecer a importância da lei de
|
No Círculo
da Emigração |
1981,
que veio acabar definitivamente com a lei salazarista e fascista
de 1959, a qual retirava automaticamente a nacionalidade portuguesa
a qualquer indivíduo que optasse por outra. Com esta
nova lei, velha de 18 anos, é possível através
de um processo burocrático, infelizmente moroso, reaver
a nacionalidade portuguesa e manter a dupla nacionalidade.
Lei libertadora, mas não menos discriminatória
para todos os portugueses que se naturalizaram Canadianos
entre 1959-1981. Antes de partir a deputada prometeu fazer
tudo o que estivesse ao seu alcance a fim de facilitar e diminuir
este processo burocrático. Esperemos que consiga obter
a aprovação de um decreto, de uma alínea,
de algo que permita restabelecer de uma forma simples e rápida
a nacionalidade portuguesa. Boa sorte.
Hoje,
aqui estamos a anunciar e a render homenagem a quem soube
levar a bom porto, uma batalha de Bom Senso e Bom Gosto,
mas nem por isso fácil. Cinco anos depois.
Aplica-se a Manuela Aguiar o que o povo muitas vezes diz:
Água mole em pedra dura tanto dá até
que fura. Furou! As pedras duras que são a burocracia
lusa e a ociosa e sonolenta actividade parlamentar portuguesa.
E à
Manuela Aguiar dizemos, como habitualmente, até à
próxima e Boa Sorte com o seu No Círculo
da Emigração, e com o novo Círculo
da Emigração por e para onde não concorre
desta vez, mas que, nem por isso, estamos certa, deixará
de marcar o caminho desta emigrolândia, onde muito se
ressona, pouco se inova, muito se grita, quase nunca se reconhece
e, permanentemente se insiste em agir de costas voltados uns
para os outros. Uns porque são do Benfica e outros
do Sporting, uns porque são de São Miguel e
outros da Terceira, uns porque são da Voz de Portugal
e outros do LusoPresse, uns porque são da Escola Portuguesa
do Atlântico e outros porque são da Escola de
Santa Cruz, etc. Enquanto, paralelamente, todos se queixam
da falta de meios e de recursos humanos. Não parece.