PAULA de VASCONCELOS: a Criação de Outro(s) por Luís Aguilar Da
10a produção da Companhia de Teatro Pigeons International
L'Autre, O Outro, The Other, apenas duas reacções do público
são possíveis, determinadas ambas, essencialmente, por fenómenos
de transfert e projecção psicológica: ou se gosta
muito ou se detesta completamente. Se o esquema de referência sócio-cultural-sensual
é de natureza puritana e racio-pragmático-tecnocrática,
repudia-se o espectáculo como se ele se dirigisse contra o esquema
de referência cultural da tribo alienada pelos valores de uma cultura
judaico-cristã. Se, pelo contrário, o esquema de referência
é determinado pela libertação do corpo e orientado
pelas pulsões sexuais de ordem onírica e inconsciente, adere-se
completamente ao espectáculo e por ele se continua o questionamento
proposto por Saramago e Paula de Vasconcelos. Situamo-nos neste segundo
tipo de gente que gosta de se rever nas fantasias e inquietações
existenciais, sem manual de instruções. Paula de Vasconcelos
traça para este espectáculo uma fronteira entre o poder
e o prazer, entre a solidão e a vida em comum, entre a liberdade
e a prisão, entre a cultura e a alienação. Cada espectador
fica numa das margens. Felizmente, a maioria na margem de lá. Com
vontade de fazer amor com o espectáculo no seu conjunto. Com os
seus inventores, actores, encenadora, técnicos, criadores de espaço
e adereços, todos esses que nos podem indicar o caminho para o
Outro. Que nos desprega do computador e da tecnologia, das várias
formas de manipulação psicológica e extorsão
afectiva, que nos arrancam da frigidez sexual, da aridez das relações
interpessoais, da globalização individualista e selvagem,
da influência pavloviana dos media, para reenviar-nos para um espaço
de intimidade onde as ondas da moralidade batem nas paredes do teatro
porque as suas portas estão fechadas a esses fenómenos-
confessa-nos a encenadora.
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