A Faculdade
de Estudos Superioresda
Universidade de Montreal promoveu, no quadro das Conferências
Gérard-Parizeau, um encontro com o sociólogo Fernando
Henrique Cardoso,
presidente do Brasil de 1995 a 2003, no passado dia 14 de Abril
de 2005, das 16 h às 18 horas, no Pavillon Claire-McNicoll
(antigo Pavillon Principal) uma conferência sobre As
Relações Norte-Sul, no contexto do Equilíbrio
Mundial em Mudança. A este acontecimento associaram-se
os Estudos Portugueses e Brasileiros da Universidade de Montreal,
tendo estudantes e professores comparecido em peso, assim como
elementos representativos das comunidades portuguesa e brasileira
de Montreal, nomeadamente os cônsules-gerais de Portugal
e do Brasil em Montreal.
Fernando
Henrique Cardoso que, aqui recebeu um doutoramento Honoris
Causa, revelou o seu duplo contentamento por, por um lado,
poder reencontrar amigos de há muito tempo, seus colegas
sociólogos que foi conhecendo pelo mundo fora nos seus
tempos de estudante e de investigador e, por outro lado, por
este doutoramento lhe ser outorgado, depois de ter deixado o
poder.
Foi um
Fernando Henrique Cardoso optimista, eloquente, carismático,
sedutor, bem-falante da língua de Molière, que
se apresentou na Universidade de Montreal, para dissertar sobre
as Relações Norte-Sul, com um espírito,
simultaneamente optimista e politicamente correcto, não
deixando porém, de emitir uma posição clara
em relação a algumas problemáticas como
a do Forum Social Mundial do qual confessa, não ser muito
entusiasta.
Fernando
Henrique Cardoso mostra um grande jogo de cintura, oscilando
entre o homem político e o sociólogo, ficando-nos
a sensação que molda o discurso consoante a plateia
que tem à sua frente, no sentido de agradar. Ideia com
que ficámos após a leitura de uma reportagem jornalística,
relatando um dia de conferências que Cardoso fez em diferentes
lugares e que mostrava que o discurso mudava consoante o público
presente. Se face a um grupo de homens de negócios se
mostrou mais preciso sobre a importância do mercado e
do capitalismo de desenvolvimento sustentado, já face
a uma comunidade estudantil o homem do Real que conteve a inflacção
galopante no Brasil foi bem mais prudente, falando de uma maneira
mais genérica, denunciando o pessimismo virulento de
alguns grupos de contestação.
Mais do
que a especulação ideológica os problemas
de desequilíbrio no comércio internacional que
impedem o desenvolvimento dos países do Sul têm
os dias contados, já que são os países
do Sul que detêm mais produtos de base a vender e, por
isso, se caminha para uma nova ordem mundial se os países
da América Latina forem capazes de criar um modelo original
ainda que copiando os países do Norte. A este propósito
referiu a originalidade do Barroco Brasileiro originalidade
que advém do facto de os brasileiros tanto quererem copiar
o Barroco Português, mas com muito mais pompa e circunstância
o que fez com que acabasse por criarem uma cópia bastante
original. Não é certamente por acaso que os Países
do Sul, fazem parte do G20.
Longe vão os tempos em que o próprio Fernando
Henrique Cardoso participou na conferência que nessa altura
opunha o Norte ao Sul e que constituiu um marco histórico
nesta problemática: numa reunião que dava continuidade
à ideia saída da conferência onde nasceu
a concepção de Países do Terceiro Mundo,
definição do sociólogo francês Sauvy.
Nessa reunião histórica também eu participei-
revela-nos o escritor Sergio Kokis que estava sentado ao nosso
lado: - como segurança do Partido Comunista - remata.
Parecendo ter ouvido Sergio Kokis, Fernando Henrique Cardoso
diz: A luta pela afirmação política
dos Países do Sul foi sempre uma luta muito conduzida
pelo bloco comunista e, como tal, guiada pela ideia do Estado-Nação
que conduziu a que muitos dos países não-alinhados
acabassem por ter um sistema político totalitário
que os afastava da ideia de base: a democracia.
E, ainda que uma boa parte dos estudantes presentes, não
partilhe das suas ideias e visão do mundo pode afirmar-se
que o ex-presidente do Brasil cativou as cerca de 300 pessoas
presentes. Fernando Henrique Cardoso quer-nos levar a pensar
que o mundo pode mudar com a redefinição das relações
internacionais no jogo actual de forças e no contexto
da globalização: a erosão do poder dos
governantes pela lei do mercado, o poder da comunicação
social, a natureza transaccional da política com os problemas
ambientais, com os fenómenos criados pelo terrorismo,
o tráfico de droga, etc. Também aqui FHC moldou
o seu discurso de forma a seduzir o público do Norte,
mais claramente o do «Primeiro Mundo», para quem,
afinal, se dirigia e que se reconfortou com a utopia da esperança
de um dia as economias «emergentes» poderem estar
ao mesmo nível dos grandes países do «Norte».
Da maneira como falou do seu país deu a entender que
tudo está a melhorar no Brasil.
O debate,
no fim, sempre curto, também se mostrou muito interessante,
recorrendo o ex-presidente do Brasil ao humor.
No fim Fernando Henrique Cardoso fez o que sempre fez: tranquilizou
aqueles que esperam uma melhor qualidade de vida para a burguesia
que não se compadece com a situação mais
difícil para os pobres, remetendo o Plano Fome Zero
de Lula da Silva para a utopia, uma vez que, por um lado, são
parcos os poderes do presidente num contexto de globalização
em que nos
situamos e, por outro lado, esse plano vira-se ainda mais para
o descontentamento daqueles para quem o plano teoricamente se
destina e isso começa logo na questão da graduação
da pobreza para saber quem pode beneficiar ou não de
cada subprograma, o que é, em si mesmo, motivo de conflito
e em última análise se vira contra a própria
popularidade do presidente. Confessa que, a este respeito, falou
com Lula da Silva, tendo este perguntado se um presidente pode
efectivamente fazer alguma coisa!
O lado
de sociólogo veio ao de cima, quando evidencia o crescimento
do trabalho informal em detrimento do emprego tradicional, alterando
a dinâmica das relações de trabalho e que
o Brasil, como país do mundo que mais mobilidade no emprego
tem, parte