Excelência,
Guy Richard Morissette, solteiro, natural
de Montreal, Quebeque – Canadá, residente na rua Ducharme,
210, Dorval, Quebeque, H9S 2H7, Canada, de nacionalidade canadiana,
estudante do programa académico de Língua
Portuguesa e Culturas Lusófonas na Universidade
de Montreal, Canadá, vem, mui respeitosamente, expor
a Vossa Excelência.
Na qualidade de aluno canadiano, estudando a maravilhosa língua
de Vossa Excelência e a pujante cultura do país de que
Vossa Excelência é o mais alto magistrado, preocupam-me
as relações ou, mais exactamente, a falta de relações
entre Portugal e duas das suas antigas colónias - Goa
e Macau
- hoje regiões que integram países recentemente
visitados pelas mais altas instituições do Estado Português,
a
primeira por Vossa Excelência e a segunda pelo senhor
primeiro-
- ministro do Governo de Portugal.
Como único país industrializado da Comunidade
dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e na
qualidade de antiga potência colonial, Portugal tem responsabilidades
históricas face às referidas antigas colónias,
responsabilidades que não tem assumido, quiça, por não
ter ultrapassado os seus complexos de antigo colonizador, o que impede
a nação que abriu as portas do Mediterrâneo e promoveu
o encontro de culturas nos séculos XV e XVI de tornar-se, hoje,
um colaborador ou parceiro privilegiado na ajuda ao desenvolvimento
económico e social nos territórios em apreço. É
de toda a importância que Portugal afirme os seus interesses diplomáticos
e comerciais na cena internacional. Com efeito, justifica-se plenamente
que a APD
(Ajuda Pública ao Desenvolvimento), seja seguida também
em relação a Goa e Macau. Tanto mais justificado este
apoio e intercâmbio, quando se sabe que essas regiões integram
dois países, a Índia e a China, que, segundo previsões
diversas e credíveis virão a ser as duas novas superpotências
do século em que vivemos. Uma “porta de entrada”
para Portugal nesses dois países, não seria política
e culturalmente de desprezar.
As relações com Macau e Goa deveriam ser uma prioridade
estratégica a longo prazo, promovidas pelo Ministério
dos Negócios Estrangeiros, assim como o estabelecimento
de laços privilegiados com esses dois territórios. Como
temos vindo a referir, Portugal tem responsabilidades históricas,
como antiga potência colonial, o que, justificaria, por si mesmo,
o alargamento da APD bilateral a Goa e Macau. Com efeito, a APD bilateral
do IPAD
(Instituto Português de Ajuda ao Desenvolvimento) à
China não chega a atingir o meio milhão de Euros para
o país inteiro ; uma quantia absolutamente insignificante quando
comparada com a que é atribuída aos PALOP
e Timor-Leste.
Sendo a situação idêntica para a Índia e
Goa justifica-se um aumento da APD bilateral a Macau e Goa reduzindo
os montantes destinados aos países que são da responsabilidade
histórica de outros (França, Espanha, Inglaterra). Tanto
mais certa esta política quando sabemos que estamos perante uma
África que cada vez mais esbanja recursos em prol da corrupção.
Não querendo reduzir esta cooperação a uma visão
meramente mercantil, consubstanciada apenas no aumento da APD bilateral,
entendemos que a renovação das relações
entre Portugal e Macau e entre Portugal e Goa passaria necessariamente
por uma cooperação técnica intensificada, a todos
os níveis, objectivo que poderia (e deveria) ser atingido sem
grande dificuldade e sem grandes custos adicionais. A título
meramente exemplificativo, consideramos que a CPLP poderia seguir o
modelo da Francofonia e permitir a Macau e a Goa fazer-se representar
nas suas instituições, do mesmo modo que as províncias
do Quebeque
e do Novo
Brunswick o fazem, possuindo representantes seus nos órgãos
oficiais da Francofonia (
OIF).
Assim, poderiam participar em todas as reuniões ministeriais
sectoriais com competências e jurisdições específicas
como Região Administrativa Especial, no caso de Macau e como
Estado no caso de Goa. Uma participação na CPLP das delegações
de Macau e Goa também iria reforçar as relações
de Macau e Goa com os outros membros da Lusofonia.
A abertura do CLP-IC/IPOR (Centro
de Língua Portuguesa, Instituto Camões/Instituto
Português do Oriente) em Macau em 1989, e a do CLP-IC
de Goa em 2000, foram dois grandes passos no sentido da cooperação
de que temos vindo a falar, mas, claramente insuficientes. Os CLP-IC
de Goa e Macau deveriam oferecer mais bolsas às pessoas e que
têm poucos recursos, a fim de facilitar o acesso à aprendizagem
da língua e cultura portuguesas. Conceder mais apoios financeiros,
logísticos e de formação aos organismos locais
que fazem a promoção da nossa língua através
dos CLP-IC é uma outra urgência. Assim, poderíamos
assegurarmo-nos de que o português se poderá difundir ainda
mais, em vez de se limitar a uma moda da elite afortunada desses territórios,
como o Espanhol o é nas Filipinas.
Embora, com um investimento maior no ensino da língua nesses
territórios seja um elemento essencial, Portugal tem condições
para intervir, através do Ministério da Educação,
na criação de novos programas de bolsas para estrangeiros
que queiram estudar nas universidades portuguesas, pois que a aprendizagem
da língua portuguesa deve constituir um imperativo nacional e
uma das maneiras de fazê-lo é, sem dúvida, a promoção
de estudos portugueses para estrangeiros em Portugal.
Pensamos que o Instituto Camões deveria proporcionar, através
da concessão de bolsas aos estudantes das Universidades de Goa
e Macau, interessados em intercâmbios, uma maior quantidade de
bolsas possibilitando aos goeses e macaenses estudar em Portugal. O
envelhecimento da população em Portugal fundamenta esta
política já que liberta lugares nas universidades e nos
institutos politécnicos do país que poderiam ser preenchidos
por alunos goeses e macaenses em particular e da Lusofonia, em geral,
pouco importando se esses alunos estrangeiros voltam para os seus países
depois de acabados os seus estudos ou permaneçam em Portugal.
De uma forma ou de outra, irão reforçar os vínculos
entre Portugal e os países e territórios de origem. Finalmente,
para que essa aproximação entre Portugal e Goa e Macau
não seja de sentido único, o Ministério
da Educação poderia criar mais programas de
concessão de bolsas destinadas, especialmente, a intercâmbios
e estágios para alunos portugueses em Goa e Macau.
Aqui deixo a Vossa Excelência estas modestas sugestões
no sentido de corporizar uma reflexão sobre a política
portuguesa face aos dois enclaves de que temos vindo a referir certo
de que, muito embora, em si mesmos, os territórios em apreço
não têm grande importância geopolítica, mas
podem tornar-se pontos estratégicos ou portas para a eventual
e desejada entrada de Portugal em duas futuras superpotências.
Estamos certos de que o devir da prosperidade da nação
portuguesa e a sobrevivência da sua língua, dependerá
das decisões que hoje tomarmos no sentido de delas nos aproximarmos,
acompanhando o passo do crescimento desses futuros impérios na
cena internacional. Com efeito, Portugal pode vir a tornar-se um aliado
de peso, passando de nação que deu novos mundos ao
mundo a um país que partilha com esses mundos cada vez mais
globalizados, no qual Portugal vive hoje a sua época de ouro
cultural, como sublinha Eduardo
Lourenço.