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Uma
delegação de três estudantes de
Língua Portuguesa e Culturas Lusófonas
da Universidade de Montreal entrevistou, no passado
sábado, dia 25 de Outubro pelas 11:30 horas da
manhã, no Hotel Loews, o Dr João Bosco
Mota Amaral, Presidente da Assembleia da República
de Portugal que teve a gentileza de conceder-lhe um
encontro exclusivo. Foi, para nós, estudantes
de Português da Universidade de Montreal, uma
honra poder entrevistar a segunda figura do Estado Português.
Ficamo-lhe gratos por isso. O Doutor Mota Amaral é
um homem inteligente, bem falante e simpático.
Assim que nos avistou, veio acolher-nos calorosamente,
o que nos encorajou pois, nós estudantes, sentíamos,
até ali como cordeiros no meio de lobos…. |
João Bosco Mota Amaral foi durante cerca de 20 anos Presidente
do Governo Regional dos Açores. É de referir que
foi Chefe de Redacção da revista Rumo nos longínquos
anos de 1965 a 1969. Ainda no domínio do jornalismo,
registámos a regularidade das crónicas que foi
publicando no Diário de Notícias entre Janeiro
de 1996 e Abril de 2002. Escreveu, entre outras, as seguintes
obras: O Desafio Insular, 1990; Natal Açoreano
(sic), 1993; O Caminho da Vitória, 1994; Autonomia
e Desenvolvimento - Um Projecto para os Açores,
1995; Em Louvor de Timor, 2002; A Autonomia dos
Açores em Acção.
LUSÓGRAFO:
Estamos neste momento a produzir um jornal didáctico
O Lusógrafo e, nesse âmbito, lembramo-nos
de entrevistar aquele que um dia foi também jornalista
e hoje é a segunda figura do Estado Português,neste
momento, de visita oficial ao Canadá. Gostaríamos
que nos dissesse quais os objectivos da sua visita e as localidades
que já visitou ou pensa visitar.
MOTA
AMARAL: A minha visita vem na sequência de um
convite do Senhor Milican, deputado federal da região
de Kingston, Toronto, para participar nas celebrações
do cinquentenário da primeira vaga de imigração
portuguesa no Canada. Celebrações que entre
outras actividades, tiveram lugar na segunda-feira passada,
no Parlamento Canadiano, em Otava. Estas comemorações
são a prova do respeito e do apreço que a comunidade
portuguesa merece no Canadá. Reconhecimento naturalmente
merecido, já que, os portugueses, em meio século,
deram um notável contributo para o progresso do Canadá.
Esta minha visita representa, acima de tudo, um encontro amistoso
com as comunidades portuguesas a que me associo para comemorar
estes 50 anos de presença portuguesa no Canadá.
Não venho pois tratar de assuntos específicos,
porque isso cabe aos responsáveis dos governos nacionais
e dos governos regionais.
LUSÓGRAFO:
Sabemos que já visitou o Canadá por várias
vezes. Gostaríamos que nos desse a sua opinião
sobre o nosso país.
MOTA
AMARAL: O Canadá é um grande país,
não só pela sua dimensão geográfica
mas também pelas suas potencialidades e capacidades
e pelo dinamismo do seu povo. É também uma fonte
de exemplos extremamente valiosos, relativamente ao convívio
multicultural e multiétnico. Paradigmas que podem servir
a experiência de países que, cada vez mais, se
constituem como sociedades multiétnicas e multiculturais,
como é o caso dos países da Europa, onde o multiculturalismo
emerge em toda a sua força.
LUSÓGRAFO:
Certamente o senhor Presidente da Assembleia da República
sabe que o Governo Português apoia os Estudos Portugueses
na Universidade de Montreal, como o fazem também os
Governos Italiano, Espanhol, Grego e Alemão que apoiam
as suas línguas e respectivas culturas. Vemos frequentemente
governantes destes países irem à nossa prestigiada
universidade à excepção dos governantes
portugueses que, nem mesmo quando foi aprovado o primeiro
programa académico de Estudos Portugueses do Quebeque,
apesar dos insistentes apelos do Professor e Responsável
pelo Programa e das inúmeras chamadas de atenção
aos organizadores e responsáveis de tais visitas, se
dignaram ir à Universidade de Montreal. A que se deve
esse facto?
MOTA AMARAL: É
pena que não tenha sido convidado pois de outro modo
teria ido. É bom que, de futuro, a Universidade dirija
os seus convites aos governantes portugueses, nomeadamente
da área da Educação e Cultura e estou
convencido que terão certamente, muito gosto em marcar
presença na Universidade de Montreal.
LUSÓGRAFO:
Não sendo de origem portuguesa estamos a aprender a
sua língua e a tomar contacto com as culturas que a
falam. Que importância atribui ao facto de haver pessoas
como nós, de certo modo embaixadores da língua
portuguesa e das culturas lusófonas?
MOTA
AMARAL: Acho que é um fenómeno interessantíssimo
e sinto-me muito satisfeito por constatar isso. É a
prova de que a Língua e Cultura Portuguesas são
suficientemente atraentes e têm realmente o seu mistério
que entusiasma; a Língua Portuguesa tem a sua beleza
e significação ecuménica. É uma
das línguas mais faladas no mundo. Sinto-me muito satisfeito
por ver que, aqui, no Canadá, em virtude de uma significativa
presença de gente portuguesa existe um interesse da
juventude pelos Estudos Portugueses.
LUSÓGRAFO:
Portugal pescou e pesca o bacalhau em águas canadianas.
Sabemos que os bancos da Terra-Nova se estão a esgotar.
Neste momento quais são as relações entre
Portugal e o Canadá a este respeito?
MOTA
AMARAL: A pesca do bacalhau em águas canadianas
praticamente desapareceu, pelo que, são poucas as relações
que existem entre Portugal e o Canadá nesse domínio.
E desapareceu precisamente porque os canadianos defendem as
suas reservas com unhas e dentes. Hoje a maior parte do bacalhau
que se consome em Portugal vem da Noruega e de outros países
nórdicos, onde se pratica a pesca do bacalhau. A antiga
frota que vinha todos os anos para as águas da Terra
Nova já não existe. Era, de resto, uma pesca
muito artesanal.
LUSÓGRAFO:
O Senhor Presidente, certamente se lembra do caso do piloto
Robert Piché e a sua heróica aterragem nos Açores.
Ele já foi homenageado por diversas entidades da aviação
civil e políticas do Quebeque e do Canadá. No
entanto, o governo português nada fez ainda para homenagear
tal feito. Lembramo-lhe que, a bordo, 95% dos passageiros
eram Portugueses. Porquê, tão ingrata atitude
das autoridades portuguesas?
MOTA AMARAL: Tratando-se
de um avião canadiano com tripulação
canadiana não é Portugal que tem de homenageá-lo.
LUSÓGRAFO:
Tendo em conta o significativo abandono escolar dos jovens
das nossas comunidades (e sabemos que, o fenómeno existe
também em Portugal) e a manifesta falta de interesse
da parte dos jovens luso-descendentes pelos estudos superiores,
gostaríamos de saber o que está a ser feito
em Portugal para mudar esta lastimável situação.
MOTA AMARAL: É
uma situação triste, esta a da desmotivação
da gente nova pelos estudos que se vê muitas vezes seduzida
pela ilusão de uma vida fácil. Muitos são
os jovens que se perdem nos meandros da droga, e de outras
misérias dos nossos tempos. Na minha perspectiva, o
abandono escolar já não é tão
dramático como há tempos que já lá
vão, em que as famílias queriam que os filhos
fossem trabalhar para ganhar dinheiro. Hoje em dia os jovens
estão desmotivados, em relação ao esforço
exigido pelos estudos, sobretudo os estudos universitários.
É preciso criar condições para que todos
os que queiram, possam seguir os estudos superiores. Por outro
lado é de lembrar a televisão como um concorrente
terrível da escola que molda a cabeça das pessoas,
no sentido de pensarem que tudo se consegue sem esforço.
E ficamo-nos por aqui, que o Senhor Presidente tinha à
sua espera vários jornalistas de vários órgãos
de informação comunitários. Terminamos
este nosso encontro, entregando-lhe o jornal Lusopresse,
sublinhando a colaboração e apoio que este jornal
comunitário tem dado aos estudantes de Estudos Portugueses
da Universidade de Montreal, informamo-lo ainda da existência
do Carrefour des Jeunes Lusophones du Québec,
associação que tem atraído muitos jovens
e sobre a qual recaem muitas expectativas.
Não
podemos deixar de considerar que esta entrevista nos decepcionou
pela maneira vaga e desempenhada como o nosso entrevistado,
afável e simpático, é certo, respondeu
a algumas das perguntas que lhe fizemos. Nomeadamente, às
perguntas relacionadas com a educação dos jovens
em Portugal e nas comunidades de luso-descendentes. Se os
nossos jovens abandonam os estudo precocemente é porque-
no entender de Mota Amaral- estão seduzidos por uma
vida fácil sem esforços e mais não ambicionam
que a boa vida. Culpadas são a droga, a televisão,
a preguiça... Mas, o que fazem as mais altas instâncias
do país para mudar esse estado de coisas? – voltamos
à carga. Como se diz aqui no Canadá, perante
esta questão começou a patinar, pois não
nos soube dizer o que, em Portugal, está a ser feito
para minorar esta triste situação do abandono
escolar e escassa frequência universitária, por
parte dos jovens de origem portuguesa.
Mas, o mais
absurdo foi quando o interrogámos sobre as razões
pelas quais o comandante Piché não tina sido
homenageado pelo Estado Português, a segunda figura
de Estado Português não nos conseguiu dizer que
seria mais logo, precisamente nesse dia, que ele próprio,
em nome do Estado Português entregaria a Robert Piché
a comenda da Ordem de Mérito. Teria o senhor Presidente
da Assembleia da República evitado uma resposta surrealista
se tivesse passado os olhos pelo seu próprio programa
de actividades. É desolador constatar que um tão
importante representante da Nação Portuguesa,
tenha uma maneira de pensar tão simplista e tão
eivada de preconceitos. O facto desta visita ao Canadá
ter um caracter mais amistoso, segundo disse, não impede
que seja mais sensível às questões sociais,
mais empenhado na difusão e promoção
da língua portuguesa, mais esclarecido sobre questões
que a Portugal dizem respeito neste grande país da
América do Norte.
O nosso encontro,
mesmo sendo curto, constituiu uma experiência muito
enriquecedora que o jornal Lusopresse e o seu director,
Norberto Aguiar permitiu-nos estar ao lado de jornalistas,
ainda que por apenas um dia! Ficámos com a sensação
de que o trabalho de jornalista é uma tarefa árdua
que exige objectividade, saber ler nas entrelinhas, ler o
discurso corporal e transmitir aos leitores o verdadeiro sentido
das respostas do entrevistado. Finalmente, constatamos que
é difícil para um jornalista não jogar
com as palavras para dar a impressão desejada e, assim,
comprometer-se com a realidade.