Uma Arquitetura Modernista
por
Vitália Rodrigues

Também para a Língua Portuguesa

Siza Vieira discute com Luís Aguilar uma arquitetura para a defesa, promoção e difusão da língua portuguesa, que passa necessariamente, pelo ensino a estrangeiros, tanto no Ensino Secundário como no Universitário e por uma magistratura de influência da parte das instituições governamentais e diplomáticas portuguesas no sentido de a mesma acompanhar o prestígio que arquitetos, cineastas, cientistas, músicos, atletas, têm logrado obter no plano internacional e mostra-se preocupado com a imposição de propinas a aprendentes de português no estrangeiro, recentemente anunciada pelo governo.

Na breve (longa para as circunstâncias) conversa que tivemos com Siza Vieira sobre a clara, simples e lúcida conferência que acabara de dar, constatamos a sua alegria em ter por perto compatriotas e sabendo do que nos ocupávamos na Universidade de Montreal, embarcou numa reflexão sobre a necessidade de começar a desenhar uma pujante e prestigiada arquitetura para a defesa, promoção, difusão e internacionalização da língua portuguesa, que passa, na sua opinião, pelo seu estudo e ensino a estrangeiros, naturalmente cativados pelos nossos mais altos valores culturais, artísticos e científicos e pela percepção e intercâmbio com os países de língua portuguesa.

Ainda tempo teve para referir algumas más decisões dos governos e que têm afetado o trabalho de quem está a fazer a obra, questionando-nos sobre o impacto que a nova propina paga pelos emigrantes (120 euros por mês) para terem aulas de português tem por aqui em Montreal.

Com a ajuda do Padre José Maria Cardoso, que estava ao nosso lado, explicamos que aqui em Montreal e também no Canadá os pais sempre custearam parte do ensino de Português dos seus filhos desde o seu início, pois o Canadá não tem, ao contrário do que se passa na Europa, o apoio do governo português, pelo que a instituição da propina referida não se aplica aqui. Ainda mais surpreso se mostrou o arquiteto com a constatação de que o ensino do português nestas paragens está entregue à iniciativa particular de instituições e pessoas.

O arquiteto Carlos Castanheira e Luís Aguilar recordam o seu encontro em 2003, na altura da exposição de maquetes de Alvaro Siza e no trabalhão e inerentes dificuldades no transporte das obras. Nessa altura, ao contrário de hoje, estiveram presentes o cônsul-geral, Nuno Bello, e o embaixador acabadinho de tomar posse, João Pedro da Silveira Carvalho. Mesmo que Siza Vieira não estivesse presente nessa altura uma das estudantes de Estudos Lusófonos entrevistou o arquiteto:

LER: 'ENTREVISTA IMAGINÁRIA COM SIZA VIEIRA"
de Catharina Aulls

Finalmente, esteve entre nós, em Montreal, o arquiteto português - que o jornal de referência local, Le devoir, identificou como brasileiro - Siza Vieira ou Álvaro Siza, como é conhecido internacionalmente, laureado com o Prémio Pritzker em 1992, o equivalente ao Nobel da Arquitetura, para apresentar no Centro Canadiano de Arquitetura (CCA) de Montreal, a 26 de abril, às 19h00, o conceito por si utilizado na construção da Fundação Iberê Camargo (um dos grandes nomes da pintura e da gravura do século XX), em Porto Alegre, no Brasil, obra galardoada com o Leão de Ouro da Bienal de Arquitetura de Veneza em 2002: uma simbiose entre o edifício e o meio ambiente, cuja estrutura é conhecida pelos volumes esculturais e uma fantástica integração nos rochedos costeiros. Um passeio completo pelos sentimentos de dois génios, de artes diferentes, que se

Siza Vieira contente por encontrar conterrâneos, que por sua vez, se orgulham da sua presença em Montreal e o elogiam pela extraordinária simplicidade com que apresentou projetos complexos. O mesmo apreço tiveram as cerca de três centenas de pessoas que assistiram à conferência.

completam: a solidão e a nostalgia do português associadas à dor e ao ódio do brasileiro tornam a nova sede um centro de melancolia, refere a crítica brasileira Ignez Ferraz.

Museu da Fundação Iberê Camargo

Nesta conferência, o arquiteto português referiu a importância dos croquis feitos à mão ao longo do processo de criação, desde os estudos da massa até aos mais ínfimos pormenores. Esta conferência, com sala repleta, cerca de 300 pessoas, e dezenas de outras em lista de espera para entrar, realizou-se paralelamente à exposição Alturas de Macchu Picchu de Martín Chambi e Álvaro Siza composta por croquis elaborados durante a viagem que Siza fez em 1995 ao Macchu Picchu, mostrando a utilização que é feita destes croquis como ferramenta de documentação e de criação.

A conferência decorreu num clima alegre e de boa disposição devido, sobretudo, ao sentido de humor do conferencista e do seu colaborador e amigo, o arquiteto Carlos Castanheira, que o acompanhou na parte final da conferência, dedicada às perguntas do público.

Siza Vieira lamenta a grande falta de sensibilidade, sobretudo em Portugal, de não se ter a capacidade de ouvir o silêncio dos espaços deixados vazios e exemplifica com a estrutura arquitetónica dos jardins públicos portugueses em que todo o espaço é sempre compulsivamente ocupado com quiosques, estátuas, colunas, etc. ao contrário do que se pode ver no Canadá em que o espaço deixado vazio é tão importante para o projeto como o que está ocupado. Lembra o arquiteto

português da existência de determinadas regras ditas de segurança e que afetam negativamente um projeto de arquitetura e desrespeitam o espaço e a inteligência das pessoas. Dá o exemplo da obrigatoriedade de indicação da saída a verde numa parede branca com porta bem visível numa sala minúscula.

Três anos é o tempo necessário para Siza Vieira elaborar um projeto de arquitetura, contrariando o que hoje em dia é moeda corrente: tudo e todos querem ver na atividade artística a rapidez dos computadores, exigindo a mesma qualidade e quantidade num curto espaço de tempo. Isto é o contrário do que um projeto de arquitetura necessita para deixar emergir a criatividade. Siza Vieira segue, tranquilamente, as vontades do seu processo criativo, excluindo totalmente as exigências irrealistas dos tempos modernos, no que à Arquitetura diz respeito.


Croquis de Álvaro Siza
#399 - Macchu Picchu, Peru, 1995
© Álvaro Siza, Arquiteto


Croquis de Álvaro Siza #399
Macchu Picchu, Peru, 1995
© Álvaro Siza, Arquitetot


Martín Chambi, vista parcial do Machu Picchu, Peru, 1927
CCA Collection © Arquivo Fotográfico Martín Chambi

Voltar à Página do