Comentário
1:
O
texto de Jacques Prévert apresenta uma situação
que metaforicamente descreve a hipótese do filtro
afectivo, a saber, a situação na qual
determinadas variáveis afectivas funcionam como
barreiras que bloqueiam a aprendizagem de uma língua
estrangeira. Mais exactamente, no presente caso, as
circunstâncias da conferência desmotivam
o dromedário – símbolo dos estudantes
noviços, sobretudo dos alunos muito jovens, que
não conhecem e ainda menos compreendem a forma
clássica de dar aula com métodos tradicionais.
O fracasso das metodologias tradicionais no desenvolvimento
de uma capacidade comunicativa entre os estudantes de
um L2 é por demais evidente. Fundamentadas no
pressuposto da fragmentação da língua
em unidades a ensinar/aprender, em termos de individualidade,
e apoiadas numa perspectiva de aprendizagem mecânica,
privilegia-se nelas o formalismo e a actividade meramente
cognitiva, assente na monitorização permanente,
inibidora da comunicação efectiva e consequente
(Araújo,
1987).
Numa situação de incompreensão
o participante perde também a confiança
e sente-se ansioso e perturbado. Um conjunto de filtros
afectivos como a ausência de motivação
e de confiança e um alto nível de ansiedade
que os acompanha impedem a entrada de factores (input)
de compreensão. As técnicas específicas
para a redução das barreiras afectivas
variam de grupo para grupo dadas as diferentes personalidades,
interesses e objectivos de professores e alunos. O objectivo
é que os membros do grupo atinjam um interesse
verdadeiro pelas opiniões de cada um, pelos seus
sentimentos e interesse, sentindo-se bem ao expressarem
pontos de vista individuais sobre os tópicos
em discussão na sala de aula (ibidem).
Em vez de centralizar o foco da aprendizagem nas formas
tradicionais (ensino da gramática com uso de
vários recursos linguísticos), é
preferível valorizar as funções
da língua (produção de significados
usando actividades que encoragem a aquisição
(jogos
de papéis, actividades
sugestopédicas, por exemplo)
para eliminar as variáveis afectivas bloqueadoras
do processo, limitando especialmente as actividades
de aprendizagem consciente (utilizados quase exclusivamente
com adolescentes ou adultos).
Pierre
Rossi
Comentário
2:
A situação
problemática no texto O Dromedário pode
ser resumida em poucas palavras: o texto retrata o
ensino convencional. Embora não se trate exatamente
de uma sala de aula e de alunos, O Dromedário
expõe a realidade do ensino convencional, onde
o professor, muitas vezes, não passa de um
conferencista.
Há muitos elementos no texto que podemos considerar
para melhor entender como o ensino convencional se
caracteriza e para apontar a sua ineficácia.
Da consideração desses elementos, podemos
também inferir o que o professor precisa evitar
em suas aulas para que os alunos possam participar
e aprender ativamente.
Vimos que o dromedário estava na expectativa
da palestra; que a palestra não atendeu às
suas expectativas; que o conferencista estava irritado
e que o único tópico da palestra era
repetido vez após vez. Muitas vezes, o professor
assume o mesmo papel do que de um conferencista desmotivado
que acredita que pode confiar na simples motivação
de aprendizado que aluno tem e que a simples enunciação
e repetição de uma informação
é suficiente para tornar o aprendizado bem-sucedido.
O resultado de tal método é muito bem
exemplificado pela reação do dromedário
que se sente frustrado e impaciente por, dado tanto
tempo, não ter aprendido nada mais do que uma
única diferença entre camelos e dromedários.
Interessante, no entanto, é que a informação
em si, é válida e muito útil,
uma vez que, saber que os dromedários têm
apenas uma bossa, permite-nos identificá-los
e diferenciá-los rapidamente dos camelos.
É aí que entra em questão uma
outra falha do ensino convencional, ou seja, a dissociação
entre a informação aprendida e a aplicação
da mesma. Não há dúvidas de que
se perguntados sobre a diferença mais marcante
entre um camelo e um dromedário, os presentes
na conferência não exitariam em mostrar
que sabiam a resposta. Na realidade, como vimos, embora
soubessem disso intelectualmente, não puderam
identificar na prática a diferença.
O conferencista falhou por não tornar as suas
palavras em ação, ou pelo menos, por
não mostrar como suas palavras poderiam ser
aplicadas. De modo geral, a interação
e participação dos ouvintes com o que
está sendo aprendido é a ponte que liga
o saber intelectual do saber prático. Cabe
ao professor, tornar possível em suas aulas
que esta ponte seja construída. Ao ensinar
um tópico gramatical, por exemplo, o professor
precisa apresentá-lo, os alunos precisam praticá-lo
sistematicamente (oralmente e em forma de exercícios
escritos), mas também é importante entender
como este tópico gramatical pode ser utilizado
no dia-a-dia. Para este fim, o professor entusiasmado
e dinâmico mostra ao aluno como ele pode fazer
uso do que aprende através de dramatizações,
debates, apresentações, que por sua
vez são repetidos em grupos pequenos ou em
duplas, preparando-os para situações
da vida real.
Daniele
K. S. Suga
Comentário
3:
A
reflexão que fiz, a propósito do texto
de Jacques
Prévert em apreço, gira
em torno de vários aspectos do processo de ensino
e aprendizagem. Do lado do ensino, considerando a metáfora
estabelecida por Jacques Prévert, pode dizer-se
que se trata de uma comunicação de cátedra,
comunicação magistral, destinada a provocar
a admiração dos estudantes pela sapiência
do mestre, muitas vezes apenas centrado no seu umbigo.
Trata-se de um processo pedagógico centrado,
sobretudo, no ensino, que relega a aprendizagem para
segundo plano. Se olharmos este fenómeno do ponto
de vista do modelo de
aprendizagem experiencial de David
Kolb, poderemos considerar que apenas
uma das etapas é percorrida, a da observação
reflexiva. Quantos professores nas aulas não
adoptam este modelo de comunicação unívoca,
de verdades feitas e pré-fabricadas, quantas
vezes reveladora da contradição entre
o que o professor diz e o que faz. Prévert no
seu texto metafórico quis, de facto, mostrar
esta contradição: horas a explicar a diferença
entre o dromedário e o Camelo e na primeira ocasião
da vida corrente, por lapsus linguae, confunde um e
outro. Por exemplo, pode acontecer a um professor que
nutra simpatia por Angola e compreenda e seja capaz
de explicar a Angola way of life e respectivos
comportamentos e apelar à tolerância para
com Angola e os angolanos e, na primeira ocasião
da vida prática, tornar-se intolerante, não
lhe servindo de nada os conhecimentos que tem. E quantas
vezes isto sucede no ensino. O especialista em Dinâmica
de Grupos que explica os fundamentos
de uma certa abordagem psicopedagógica e que
ele mesmo é incapaz de trabalhar em grupo. E
os exemplos multiplicam-se, a ponto de dizer-se que
quem sabe faz e quem não sabe ensina. O
conferencista imaginado por Jacques Prévert nas
suas Histórias para Crianças Impossíveis,
faz-me pensar no que Oscar Wilde disse sobre exemplares
desta fauna docente que pululam um pouco por todo o
lado onde há escolas: todos quantos são
incapazes de aprender acabam enveredando pelo ensino.
Por isso, hoje, o eixo do processo de ensino/aprendizagem
está a deslocar-se da necessidade de saber o
que ensinar para a necessidade de saber como se aprende.
Alain ( Émile Chartier) sintetiza de forma magistral
a problemática abordada: De uma lição
magistral ou de uma comunicação de cátedra
quase nada se poderá reter ao cabo de oito dias
e, após quinze dias, restará absolutamente
nada.
Vitália
Rodrigues
Comentário
4:
Neste
exemplo identifiquei mais do que uma situação
problemática para a aprendizagem do dromedário
na dita conferência a que assistiu.
Em primeiro lugar o jovem dromedário não
estava bem disposto, o que, por si só, predispõe
a que não estivesse mentalmente motivado para
a aprendizagem. O ensino
sugestopédico (método
não convencional de ensino/aprendizagem) proporciona
aos estudantes abertura à aprendizagem e à
experiência o que os motiva. Em segundo lugar,
as expectativas do jovem dromedário eram, por
um lado muito grandes e, por outro exteriores às
suas necessidades, o que fez com que ele não
dormisse na noite anterior à conferência.
Segundo Lozanov,
é essencial estar-se bem disposto e ter dormido
bem antes de se começar a aprender alguma coisa
nova. Em terceiro lugar, não havia música
e o método sugestopédico aconselha a criação
de um ambiente com música para estimular subliminarmente
as zonas periféricas do cérebro durante
a aprendizagem. Em quarto lugar, é de notar que
o ambiente geral descrito por Jacques
Prévert não era dos melhores
já que o jovem dromedário não se
sentia confortável e estava com calor. Ora, aconselha-se,
tanto quanto é possível, que o professor
proporcione um bom e confortável ambiente que,
sabemos, facilita as aprendizagens. É de referir,
um quinto ponto: o conferencista parecia irritado e
ele próprio com expectativas muito elevadas e
centrado apenas no seu ensino, parecendo não
querer saber sobre a forma como os outros aprendem.
Por último, o professor (o conferencista) parece
utilizar sempre o mesmo método e, consequentemente,
a mesma forma de comunicação pedagógica:
a comunicação expositiva e unidireccional.
Este tipo de comunicação privilegia os
estudantes mais auditivos, excluindo os visuais e, sobretudo
os cenestésicos (parece-me bem que o jovem dromedário
privilegia este canal de percepção sensorial).
Afinal, a conferência foi dada como muitas aulas
são dadas na nossa universidade, em particular
e nas instituições académicas,
em geral. Ou seja: o conferencista é o protótipo
de um professor convencional, fazendo um ensino mais
feito do que dito, centrado mais no ensino do que na
aprendizagem, esquecendo de recorrer a estratégias
motivacionais, parecendo esquecer que os aprendentes
não aprendem todos da mesma maneira.
Daphné
Santos-Vieira
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Comentário
5:
Tendo
em conta a reflexão produzida nos nossos
encontros e nos textos de apoio fornecidos, podemos
dividir em pelo menos três, as áreas
do processo de aprendizagem em questão na
metáfora de Jacques
Prévert : o meio ambiente,
a motivação do estudante para a aprendizagem
e o papel e método de aprendizagem utilizado
pelo professor.
Considerando que se sabe que, por exemplo, pelo
método
sugestopédico, os alunos aprendem
mais depressa e melhor que pelos métodos
tradicionais; que em todos os sítios onde
se viu aplicada, a Sugestopedia proporciona melhores
resultados e é considerada um pouco por todo
o mundo como um método revolucionário,
com resultados miraculosos e, ainda, que a Sugestopedia
pode ser utilizada em todas as formas de aprendizagem,
ela confronta-se, desde logo, com os métodos
convencionais, na sua opinião, o maior obstáculo
às aprendizagens, inovadoras e eficazes.
É à luz deste método, ou anti-método
que passo a analisar o texto de Prévert:
Nota-se
que o jovem dromedário não estava
nada confortável com a situação
de aprendizagem: não suportava o calor, estava
muito mal sentado e a bossa também o incomodava
muito; por isso se roçava no encosto da cadeira.
Ora, a preocupação permanente e dominante
do método sugestopédico é que
a aprendizagem se efectue num ambiente de grande
concentração da atenção
e exige dos professores a criação
de uma atmosfera relaxada de tensão, o que
na situação que estamos a analisar
não sucede.
Em
segundo lugar, nota-se que se tratava de uma conferência
que não motivava nada o dromedário,
apesar das grandes expectativas que lhe tiraram
o sono. Para que o aluno aprenda é necessário
que esteja motivado e elimine certas barreiras criadas
por processos de aprendizagem anteriores. Mas, no
exemplo metafórico, a conferência não
era nada do que se tinha pensado: não havia
música, era uma decepção, maçadora
que quase fazia chorar. Ora, o método sugestopédico
baseia-se na sede de aprender do estudante, na rápida
aquisição de conhecimentos sem esforço
e no desenvolvimento das
capacidades inconscientes, ligando, assim, os aspectos
lógicos com os aspectos emocionais da aprendizagem.
Pois, os seus princípios específicos
são a alegria, a ausência de tensão,
a unidade do consciente e do inconsciente, a activação
de reservas da personalidade, o apelo constante
ao desenvolvimento pessoal e a interacção
sugestiva. Também Lozanov
nota que a tensão extenuante e angustiante
verificada na maior parte das práticas pedagógicas
provém muitas vezes da insegurança
do estudante e da falta de confiança nas
suas próprias capacidades de compreensão,
de memorização e de utilização
da informação nova que lhe é
fornecida.
Uma terceira e última nota refere-se ao papel
do professor e do ensino na aprendizagem. Quando
o conferencista, visivelmente tenso falava de dromedários
e camelos, pôde verificar-se que repetia a
mesma informação insistentemente,
talvez por considerar os outros burros e acreditar
nos milagres de um ensino baseado na memorização
e na repetição, redundante. No entanto,
sabemos que uma aprendizagem sem esforço,
conduz cada estudante a aprender em menos tempo
e com mais eficácia do que pelos métodos
convencionais.
Para além da graça da anedota ela
revela a dicotomia entre o que se diz e o que se
faz: quando o dromedário irritado morde o
conferencista, este exclama: «Camelo!».
E mais grave é que o resto dos participantes
na conferência, depois de o ouvirem durante
horas, também falharam em aplicar o conhecimento
na prática, pondo-se aos berros a chamarem
Camelo ao dromedário. Sua porcaria
de camelo! É de reter a este propósito
a citação de Bernard
Dufeu: Há que observar com
cuidadoso rigor as consequências positivas
e negativas que têm a linguagem utilizada
pelo animador e os comportamentos que adopta em
relação aos participantes e à
aprendizagem.
Em suma, quanto ao papel do professor não
convencional exige-se que tenha «sensibilidade,
criatividade, espontaneidade, de criador de situações,
de observador participante, de actor-participante,
psicólogo, animador de grupo, psicoterapeuta,
actor, artista...», em vez de simplesmente
ser professor-gravador-transmissor. Que seja, igualmente,
criador de material didáctico único
e inovador, como por exemplo: fichas com citações
de obras de autor, pequenas cenas de situação,
jogos, simulações, canções,
material didáctico interactivo na rede, etc.
Yuri
de Barros
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ACTIVIDADE
REPORTE-SE A ESTES
TEXTOS PARA CIMENTAR A SUA POSIÇÃO INTERPRETATIVA
DA METÁFORA DE JACQUES PRÉVERT RELATIVA
À INTERVENÇÃO/RELAÇÃO
EDUCATIVA E SOBRE MÉTODOS CONVENCIONAIS VERSUS
NÃO CONVENCIONAIS DE ENSINO/ APRENDIZAGEM.
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©
Luís Aguilar (2000). Manual de Comunic-Acção
para o Ensino do Português, Língua Estrangeira
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