Université de Montréal - Faculté des arts et des sciences
Département de Littératures et de langues modernes
et Direction de l'enseignement des langues et de cultures étrangères
Mineur en langue portugaise et cultures lusophones
PTG 1954-Portugais idiomatique et composition
PTG 1955-Portugais: communications orale et écrite
PTG 2050-Portugais: langue étrangère

Professeur invité d'Études portugaises et Docente do Instituto Camões: Luís Aguilar

8a


ANÁLISE DE UMA SITUAÇÃO PROBLEMÁTICA

a partir da metáfora criada por Jacques Prévert em O Dromedário


RESPOSTAS DADAS POR ALGUNS ESTUDANTES QUE FREQUENTARAM A CADEIRA DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES, PORTUGUÊS LÍNGUA ESTRANGEIRA DO CURSO DE LÍNGUA PORTUGUESA E CULTURAS LUSÓFONAS DA UNIVERSIDADE DE MONTREAL

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Comentário 1:

O texto de Jacques Prévert apresenta uma situação que metaforicamente descreve a hipótese do filtro afectivo, a saber, a situação na qual determinadas variáveis afectivas funcionam como barreiras que bloqueiam a aprendizagem de uma língua estrangeira. Mais exactamente, no presente caso, as circunstâncias da conferência desmotivam o dromedário – símbolo dos estudantes noviços, sobretudo dos alunos muito jovens, que não conhecem e ainda menos compreendem a forma clássica de dar aula com métodos tradicionais. O fracasso das metodologias tradicionais no desenvolvimento de uma capacidade comunicativa entre os estudantes de um L2 é por demais evidente. Fundamentadas no pressuposto da fragmentação da língua em unidades a ensinar/aprender, em termos de individualidade, e apoiadas numa perspectiva de aprendizagem mecânica, privilegia-se nelas o formalismo e a actividade meramente cognitiva, assente na monitorização permanente, inibidora da comunicação efectiva e consequente (Araújo, 1987).

Numa situação de incompreensão o participante perde também a confiança e sente-se ansioso e perturbado. Um conjunto de filtros afectivos como a ausência de motivação e de confiança e um alto nível de ansiedade que os acompanha impedem a entrada de factores (input) de compreensão. As técnicas específicas para a redução das barreiras afectivas variam de grupo para grupo dadas as diferentes personalidades, interesses e objectivos de professores e alunos. O objectivo é que os membros do grupo atinjam um interesse verdadeiro pelas opiniões de cada um, pelos seus sentimentos e interesse, sentindo-se bem ao expressarem pontos de vista individuais sobre os tópicos em discussão na sala de aula (ibidem).


Em vez de centralizar o foco da aprendizagem nas formas tradicionais (ensino da gramática com uso de vários recursos linguísticos), é preferível valorizar as funções da língua (produção de significados usando actividades que encoragem a aquisição (jogos de papéis, actividades sugestopédicas, por exemplo) para eliminar as variáveis afectivas bloqueadoras do processo, limitando especialmente as actividades de aprendizagem consciente (utilizados quase exclusivamente com adolescentes ou adultos).


Pierre Rossi


Comentário 2:

A situação problemática no texto O Dromedário pode ser resumida em poucas palavras: o texto retrata o ensino convencional. Embora não se trate exatamente de uma sala de aula e de alunos, O Dromedário expõe a realidade do ensino convencional, onde o professor, muitas vezes, não passa de um conferencista.

Há muitos elementos no texto que podemos considerar para melhor entender como o ensino convencional se caracteriza e para apontar a sua ineficácia. Da consideração desses elementos, podemos também inferir o que o professor precisa evitar em suas aulas para que os alunos possam participar e aprender ativamente.

Vimos que o dromedário estava na expectativa da palestra; que a palestra não atendeu às suas expectativas; que o conferencista estava irritado e que o único tópico da palestra era repetido vez após vez. Muitas vezes, o professor assume o mesmo papel do que de um conferencista desmotivado que acredita que pode confiar na simples motivação de aprendizado que aluno tem e que a simples enunciação e repetição de uma informação é suficiente para tornar o aprendizado bem-sucedido.

O resultado de tal método é muito bem exemplificado pela reação do dromedário que se sente frustrado e impaciente por, dado tanto tempo, não ter aprendido nada mais do que uma única diferença entre camelos e dromedários. Interessante, no entanto, é que a informação em si, é válida e muito útil, uma vez que, saber que os dromedários têm apenas uma bossa, permite-nos identificá-los e diferenciá-los rapidamente dos camelos.

É aí que entra em questão uma outra falha do ensino convencional, ou seja, a dissociação entre a informação aprendida e a aplicação da mesma. Não há dúvidas de que se perguntados sobre a diferença mais marcante entre um camelo e um dromedário, os presentes na conferência não exitariam em mostrar que sabiam a resposta. Na realidade, como vimos, embora soubessem disso intelectualmente, não puderam identificar na prática a diferença.

O conferencista falhou por não tornar as suas palavras em ação, ou pelo menos, por não mostrar como suas palavras poderiam ser aplicadas. De modo geral, a interação e participação dos ouvintes com o que está sendo aprendido é a ponte que liga o saber intelectual do saber prático. Cabe ao professor, tornar possível em suas aulas que esta ponte seja construída. Ao ensinar um tópico gramatical, por exemplo, o professor precisa apresentá-lo, os alunos precisam praticá-lo sistematicamente (oralmente e em forma de exercícios escritos), mas também é importante entender como este tópico gramatical pode ser utilizado no dia-a-dia. Para este fim, o professor entusiasmado e dinâmico mostra ao aluno como ele pode fazer uso do que aprende através de dramatizações, debates, apresentações, que por sua vez são repetidos em grupos pequenos ou em duplas, preparando-os para situações da vida real.

Daniele K. S. Suga


Comentário 3:

A reflexão que fiz, a propósito do texto de Jacques Prévert em apreço, gira em torno de vários aspectos do processo de ensino e aprendizagem. Do lado do ensino, considerando a metáfora estabelecida por Jacques Prévert, pode dizer-se que se trata de uma comunicação de cátedra, comunicação magistral, destinada a provocar a admiração dos estudantes pela sapiência do mestre, muitas vezes apenas centrado no seu umbigo. Trata-se de um processo pedagógico centrado, sobretudo, no ensino, que relega a aprendizagem para segundo plano. Se olharmos este fenómeno do ponto de vista do modelo de aprendizagem experiencial de David Kolb, poderemos considerar que apenas uma das etapas é percorrida, a da observação reflexiva. Quantos professores nas aulas não adoptam este modelo de comunicação unívoca, de verdades feitas e pré-fabricadas, quantas vezes reveladora da contradição entre o que o professor diz e o que faz. Prévert no seu texto metafórico quis, de facto, mostrar esta contradição: horas a explicar a diferença entre o dromedário e o Camelo e na primeira ocasião da vida corrente, por lapsus linguae, confunde um e outro. Por exemplo, pode acontecer a um professor que nutra simpatia por Angola e compreenda e seja capaz de explicar a Angola way of life e respectivos comportamentos e apelar à tolerância para com Angola e os angolanos e, na primeira ocasião da vida prática, tornar-se intolerante, não lhe servindo de nada os conhecimentos que tem. E quantas vezes isto sucede no ensino. O especialista em Dinâmica de Grupos que explica os fundamentos de uma certa abordagem psicopedagógica e que ele mesmo é incapaz de trabalhar em grupo. E os exemplos multiplicam-se, a ponto de dizer-se que quem sabe faz e quem não sabe ensina. O conferencista imaginado por Jacques Prévert nas suas Histórias para Crianças Impossíveis, faz-me pensar no que Oscar Wilde disse sobre exemplares desta fauna docente que pululam um pouco por todo o lado onde há escolas: todos quantos são incapazes de aprender acabam enveredando pelo ensino. Por isso, hoje, o eixo do processo de ensino/aprendizagem está a deslocar-se da necessidade de saber o que ensinar para a necessidade de saber como se aprende. Alain ( Émile Chartier) sintetiza de forma magistral a problemática abordada: De uma lição magistral ou de uma comunicação de cátedra quase nada se poderá reter ao cabo de oito dias e, após quinze dias, restará absolutamente nada.

Vitália Rodrigues


Comentário 4:

Neste exemplo identifiquei mais do que uma situação problemática para a aprendizagem do dromedário na dita conferência a que assistiu.

Em primeiro lugar o jovem dromedário não estava bem disposto, o que, por si só, predispõe a que não estivesse mentalmente motivado para a aprendizagem. O ensino sugestopédico (método não convencional de ensino/aprendizagem) proporciona aos estudantes abertura à aprendizagem e à experiência o que os motiva. Em segundo lugar, as expectativas do jovem dromedário eram, por um lado muito grandes e, por outro exteriores às suas necessidades, o que fez com que ele não dormisse na noite anterior à conferência. Segundo Lozanov, é essencial estar-se bem disposto e ter dormido bem antes de se começar a aprender alguma coisa nova. Em terceiro lugar, não havia música e o método sugestopédico aconselha a criação de um ambiente com música para estimular subliminarmente as zonas periféricas do cérebro durante a aprendizagem. Em quarto lugar, é de notar que o ambiente geral descrito por Jacques Prévert não era dos melhores já que o jovem dromedário não se sentia confortável e estava com calor. Ora, aconselha-se, tanto quanto é possível, que o professor proporcione um bom e confortável ambiente que, sabemos, facilita as aprendizagens. É de referir, um quinto ponto: o conferencista parecia irritado e ele próprio com expectativas muito elevadas e centrado apenas no seu ensino, parecendo não querer saber sobre a forma como os outros aprendem. Por último, o professor (o conferencista) parece utilizar sempre o mesmo método e, consequentemente, a mesma forma de comunicação pedagógica: a comunicação expositiva e unidireccional. Este tipo de comunicação privilegia os estudantes mais auditivos, excluindo os visuais e, sobretudo os cenestésicos (parece-me bem que o jovem dromedário privilegia este canal de percepção sensorial).

Afinal, a conferência foi dada como muitas aulas são dadas na nossa universidade, em particular e nas instituições académicas, em geral. Ou seja: o conferencista é o protótipo de um professor convencional, fazendo um ensino mais feito do que dito, centrado mais no ensino do que na aprendizagem, esquecendo de recorrer a estratégias motivacionais, parecendo esquecer que os aprendentes não aprendem todos da mesma maneira.

Daphné Santos-Vieira


Comentário 5:

Tendo em conta a reflexão produzida nos nossos encontros e nos textos de apoio fornecidos, podemos dividir em pelo menos três, as áreas do processo de aprendizagem em questão na metáfora de Jacques Prévert : o meio ambiente, a motivação do estudante para a aprendizagem e o papel e método de aprendizagem utilizado pelo professor.

Considerando que se sabe que, por exemplo, pelo método sugestopédico, os alunos aprendem mais depressa e melhor que pelos métodos tradicionais; que em todos os sítios onde se viu aplicada, a Sugestopedia proporciona melhores resultados e é considerada um pouco por todo o mundo como um método revolucionário, com resultados miraculosos e, ainda, que a Sugestopedia pode ser utilizada em todas as formas de aprendizagem, ela confronta-se, desde logo, com os métodos convencionais, na sua opinião, o maior obstáculo às aprendizagens, inovadoras e eficazes. É à luz deste método, ou anti-método que passo a analisar o texto de Prévert:

Nota-se que o jovem dromedário não estava nada confortável com a situação de aprendizagem: não suportava o calor, estava muito mal sentado e a bossa também o incomodava muito; por isso se roçava no encosto da cadeira. Ora, a preocupação permanente e dominante do método sugestopédico é que a aprendizagem se efectue num ambiente de grande concentração da atenção e exige dos professores a criação de uma atmosfera relaxada de tensão, o que na situação que estamos a analisar não sucede.

Em segundo lugar, nota-se que se tratava de uma conferência que não motivava nada o dromedário, apesar das grandes expectativas que lhe tiraram o sono. Para que o aluno aprenda é necessário que esteja motivado e elimine certas barreiras criadas por processos de aprendizagem anteriores. Mas, no exemplo metafórico, a conferência não era nada do que se tinha pensado: não havia música, era uma decepção, maçadora que quase fazia chorar. Ora, o método sugestopédico baseia-se na sede de aprender do estudante, na rápida aquisição de conhecimentos sem esforço e no desenvolvimento das capacidades inconscientes, ligando, assim, os aspectos lógicos com os aspectos emocionais da aprendizagem. Pois, os seus princípios específicos são a alegria, a ausência de tensão, a unidade do consciente e do inconsciente, a activação de reservas da personalidade, o apelo constante ao desenvolvimento pessoal e a interacção sugestiva. Também Lozanov nota que a tensão extenuante e angustiante verificada na maior parte das práticas pedagógicas provém muitas vezes da insegurança do estudante e da falta de confiança nas suas próprias capacidades de compreensão, de memorização e de utilização da informação nova que lhe é fornecida.

Uma terceira e última nota refere-se ao papel do professor e do ensino na aprendizagem. Quando o conferencista, visivelmente tenso falava de dromedários e camelos, pôde verificar-se que repetia a mesma informação insistentemente, talvez por considerar os outros burros e acreditar nos milagres de um ensino baseado na memorização e na repetição, redundante. No entanto, sabemos que uma aprendizagem sem esforço, conduz cada estudante a aprender em menos tempo e com mais eficácia do que pelos métodos convencionais.

Para além da graça da anedota ela revela a dicotomia entre o que se diz e o que se faz: quando o dromedário irritado morde o conferencista, este exclama: «Camelo!». E mais grave é que o resto dos participantes na conferência, depois de o ouvirem durante horas, também falharam em aplicar o conhecimento na prática, pondo-se aos berros a chamarem Camelo ao dromedário. Sua porcaria de camelo! É de reter a este propósito a citação de Bernard Dufeu: Há que observar com cuidadoso rigor as consequências positivas e negativas que têm a linguagem utilizada pelo animador e os comportamentos que adopta em relação aos participantes e à aprendizagem.

Em suma, quanto ao papel do professor não convencional exige-se que tenha «sensibilidade, criatividade, espontaneidade, de criador de situações, de observador participante, de actor-participante, psicólogo, animador de grupo, psicoterapeuta, actor, artista...», em vez de simplesmente ser professor-gravador-transmissor. Que seja, igualmente, criador de material didáctico único e inovador, como por exemplo: fichas com citações de obras de autor, pequenas cenas de situação, jogos, simulações, canções, material didáctico interactivo na rede, etc.

Yuri de Barros

ACTIVIDADE

REPORTE-SE A ESTES TEXTOS PARA CIMENTAR A SUA POSIÇÃO INTERPRETATIVA DA METÁFORA DE JACQUES PRÉVERT RELATIVA À INTERVENÇÃO/RELAÇÃO EDUCATIVA E SOBRE MÉTODOS CONVENCIONAIS VERSUS NÃO CONVENCIONAIS DE ENSINO/ APRENDIZAGEM.

 

© Luís Aguilar (2000). Manual de Comunic-Acção para o Ensino do Português, Língua Estrangeira

 

 

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