Nove Ilhas, Dez Províncias...

Por
Cidália Silva


Eram trinta e seis jovens. Trinta e seis ilhas à descoberta de outras ilhas. Partiram do outro lado do mar numa aventura que duraria oito dias no paraíso açoriano, mais propriamente na legendária cidade de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira. Raízes Açorianas, Canadá 50 Anos Depois, assim se soletrava o título do encontro promovido pela Direcção Regional das Comunidades, que reuniu 36 filhos de emigrantes, oriundos das nove ilhas do arquipélago, que habitam as dez províncias do Canadá. Com iniciativas deste género o Governo Regional dos Açores pretende promover os Açores nas comunidades radicadas no estrangeiro, nomeadamente as comunidades Luso-Canadianas que comemoram este ano o cinquentenário da chegada da primeira vaga oficial de imigrantes ao Canadá.

Através de um programa de conferências e actividades culturais intenso e diversificado, os jovens foram retomando contacto com as suas raízes. Raízes estas, que, trasladadas, há já mais de meio século, nasceram e desenvolveram-se noutro continente. Evoluíram numa outra terra, cresceram num outro ambiente, desabrocharam num outro clima longe do berço dos pais, perdendo assim a noção do tempo e sofrendo, por vezes, a erosão da dupla realidade Açoriana-Canadiana. Isto porque os pais, emigrantes, longe da Terra-Mãe, num misto de saudade e de apego à sua identidade cultural e memória colectiva, teimam em transmitir aos seus filhos, muitas vezes contra ventos e marés, a imagem e os valores culturais que levaram na sua bagagem identitária há 20, 30, 40 anos. Imagem esta que é guardada quase religiosamente no álbum das recordações e é transmitida aos filhos como património familiar imerso nas tradições sócioculturais. É o caso da Língua de Camões que sobrevive nestas terras de além-mar, muitas vezes graças aos avós, ainda que seja muitas vezes preterida pela língua de Shakespeare, na versão americana. Alguns oradores, ainda que, de origem lusitana acharam normal num encontro sobre “Raízes”falarem em Inglês, para gáudio de muitos participantes também de origem lusa.

Mergulhados no contexto actual dos Açores, viajando da história à geografia, passando pela literatura (poesia) e gastronomia, falando de política e economia na língua dos pais, os jovens foram levados a descobrir um arquipélago que, apesar da sua pequena dimensão e das suas dificuldades económicas, rico em belezas naturais, transborda de calor humano e revela através da simplicidade do seu povo, a essência de se ser ilhéu, na imensidade do Atlântico.
Retomar o contacto com as raízes, foi também reinventar o encontro, criar novas amizades, redescobrir a alegria e o divertimento. Foi a descoberta de novos talentos, de jovens dinâmicos e cheios de entusiasmo, apaixonados pela vida. De jovens orgulhosos de se sentirem portugueses (mesmo falando inglês...), de jovens extraordinários que vivem espalhados por estas dez províncias do Canadá, como ilhas dispersas rodeadas por um mar de afectos e de desafios. Rodeados por um oceano que une agora o que antes separou.

O que ficou desta experiência? Uma imagem positiva dos Açores, mais rejuvenescida, mais atraente mais contemporânea, mandando às urtigas a imagem dos Açores como uma terra de miséria e atraso de vida que, infelizmente, alguns compatriotas que há muito não visitam os Açores, ainda carregam consigo.

Por agora, e para já, restam as recordações de noites de farra, de manhãs ensonadas, de emoções partilhadas... e com elas uma vontade de voltar criada pelos laços de amizade que perdurarão... Sinto ainda bem fresca a saudade do mar, das rochas aquecidas pelo Sol, daquela bruma que envolve a ilha num mistério e se dissipa à tardinha... Inspiração poética, razão desta nostalgia que trazemos no peito ilhéu, sempre em busca de novas experiências e de terra firme, sempre em busca de um novo sonho recheado de partidas e chegadas.

Raízes vulcânicas, que se espalham em terras de gelo. Luso-Canadianos, luso-descendentes, luso-quebequenses, açor-canadianos ou açor-quebequenses, sinónimo de jovens que transportam na alma um hífen escrito a azul pelo Atlântico. Um hífen que é simultaneamente uma ponte e um trav(ess)ão.