LUSOFONIA: OS NOVOS MUNDOS DO MUNDO
Pesquisa Orientada na Rede
por Luís Aguilar



Recursos na Rede - Sebenta Digital Lusófona

A Distância Invisível

Por EDUARDO PRADO COELHO
In Público, 30 de Abril de 2004

Já se tornou uma rotina. Antigamente eram fotógrafos, publicitários, especialistas de "marketing". Hoje estão em todo o lado. São os brasileiros. A gente entra num café, e o empregado é brasileiro. Vai à caixa pagar o estacionamento e ouve falar o português do Brasil. Compra uns sapatos e é acolhido por uma brasileira. Adquire uma revista de poesia (dou o melhor dos exemplos: "Inimigo Rumor") e encontra colaboradores portugueses e brasileiros. Compra um disco e é a voz esmagadora de Virgínia Rodrigues a cantar afro-sambas. Quer aprender a ler a poesia portuguesa moderna e contemporânea, e tem um amplo volume desse leitor excepcional que é Jorge Fernandes da Silveira, intitulado "Verso com verso" (na Angelus Novus). Os brasileiros estão em todo o lado - e estão naturalmente, numa verdadeira fraternidade. É verdade que mantêm laços de solidariedade entre si, e estranho seria se o não fizessem. Mas integram-se plenamente na vida portuguesa, e contribuem para essa dimensão intercultural que é necessário desenvolver.

Há dias, os jornais noticiaram que se estão a criar escolas interculturais em Coimbra, Luanda e Recife, através de uma organização não governamental, a CEA, isto é, a Cooperativa de Ensino e Arte. E a CPLP (que começa a dar alguns discretos sinais de vida) dá o seu apoio. É em coisas dessas que ela justifica a sua existência. O Instituto António Sérgio também vai participar através de equipamentos e pagamento dos primeiros professores. No projecto já esboçado, poder-se-á ir do ensino pré-escolar ao ensino superior. Para o Brasil, prevêem-se escolas em Manaus, Rio de Janeiro e São Paulo. O projecto é apaixonante.

Aproveitando esta vaga, uma excelente jornalista brasileira, que em Portugal foi responsável pelo projecto da "Ícone" (onde estava também Ana Sousa Dias), de nome Paula Ribeiro, lançou-se agora numa admirável aventura: tentar fazer um jornal semanal para os brasileiros que estão em Portugal e para os portugueses que se interessam pelo Brasil. Já vai em mais de dez números, calculo eu, e é uma leitura muito interessante e simpática. Leve em todos os sentidos (com uma notável qualidade gráfica), mas com aquele agudo sentido de qualidade que Paula Ribeiro gosta de impor nos seus projectos.

Folheemos o n.º 9, correspondente à semana que se iniciava em 15 de Abril. A telenovela está presente na primeira página, para nos contar que, na "Celebridade", ainda havemos de ver a protagonista, a actriz Malu Mader, "grávida, presa e pobre". Mas é-nos prometido um aliciante suplementar: a morte de Lineu Vasconcelos (que parece com vocação para ser assassinado) e o habitual rol de suspeitos em que o mistério apenas se desvendará no último episódio. Mas o "Correio do Brasil" tem coisas bem mais interessante: uma crónica de Alberto Dines, crónicas de jornalistas portugueses (recordemos o belo texto de Maria João Guardão), indicações sobre lugares onde comer gastronomia brasileira, um "dossier" sobre o novo disco de Caetano, a evocação do inesquecível "Morte e Vida Severina", um artigo sobre Melo Neto, e duas páginas que nos deixam em estado de graça sobre a pequena cidade de Paraty. Há ainda o desporto, os livros, e as informações relativas ao GNT. No final da leitura, estamos um pouco mais brasileiros, e espero que os brasileiros se tenham tornado um pouco mais portugueses. A distância vai-se tornando invisível.