Homenagem a Joviano Vaz,
por
Luís Aguilar

(resumo da comunicação de 7 de Junho de 2008)


Luís Aguilar no momento em que proferia o seu discurso de homenagem a Joviano Vaz.


Vista geral de Júpiter (Joviano)


Moedas com a esfínge do Imperdor Joviano

 

POEMAS DE JOVIANO VAZ

In Saturnia

 

MEU PENSAMENTO

Meu pensamento
Voga sem fim
Nesta noite interminável.
Oiço bater as horas.
Elas passam e eu fico.
Fico esperando
Fico pensando,
Fico sonhando.
Mas o meu sonho é irrealizável
Num presente que me foge.
Gostaria de apanhar o tempo presente
E mudá-lo à minha maneira
Sem preconceitos,
Sem dificuldades,
Só mudá-lo.
Nada mais.
Porque razão o destino
Me é mais uma vez adverso?
E afinal tudo podia ser simples.
Bastava apenas um sim
Que não pode chegar,
Porque a vida é assim.
No momento de atingir a meta
Esta foge, indecisa,
E deixa-me sozinho
Nesta noite interminável.
Oiço bater as horas
Nada mais.

SINTO MUITO

Sinto muito
Nao a ter conhecido antes
Como a flor que desabrocha
E no vento se confunde.
Flor exótica no caminho encontrada
Porque está tão longe mesmo perto de mim?
Talvez um dia sentirei o seu perfume
Na planície em flor…
Por agora sei que apenas está
E que não vai partir.
Fique toda inteira
Sem nada dizer
No silêncio
Da madrugada que desponta
E que ilumina a sua alma
Na etérea região
Da beleza que a rodeia.
Fique assim.
Nao parta.


FUI PROCURÁ-LA HOJE

Fui procurá-la hoje
E não a vi.
Onde está?
Não sei,não sei.
Que pena.
A sua ausência pesa-me.
Só a sua presença me vivifica.
Não parta.
Não se ausente.
Fique comigo.
O caminho é talvez longo.
Mas tudo compensa
Para quem sabe esperar, viver e recordar ...

OS TEUS OLHOS

São da cor do mar
Teus olhos, Maria
Para os conquistar
Loucuras faria.

Sem saber cantar
Cantar saberia
E sem mesmo falar
Palavras diria

Se tu me pedisses
Questão de um momento,
Sem que tu me visses
Falaria ao vento.

Montes subiria
Para ver o mar
Vales desceria
Para te encontrar.

Se tu me pedisses
Loucuras faria,
Mesmo que tu visses
Que me importaria

E ao ver-te passar
Na tarde tão fria
Saberei cantar
Teu nome, Maria.

 

in Saturnia, página de Manuel Carvalho.

Diz um célebre psiquiatra nascido em Montreal e que revolucionou o mundo da Psicologia com a sua Teoria da Personalidade, a Análise Transaccional, que o nome que os nossos pais nos dão, condiciona toda a nossa (psico) vida, do nascimento à morte, coisa que nos ultrapassa e a que não conferimos grande importância olhando de esguelha, pois não tem lógica. Diz, pois Eric Berne, que em 2010 comemora o centenário do seu nascimento em Montreal: Os nomes, os nomezinhos, cognomes, alcunhas e outras nomenclaturas infligidas ao inocente recém-nascido, indicam claramente o caminho que os pais lhe destinaram.

Analisemos então o nome do nosso homenageado desta noite, cabendo-lhes, caros amigos, decidir da pertinência da teoria de Eric Berne de que nos vamos servir para apresentar Joviano Vaz. Deram ao nosso conterrâneo o invulgar nome de Joviano, o que desde logo o torna num ser único, raro. Da nossa parte, com o nome de Joviano, só conhecemos mesmo o homenageado desta noite.

Joviano é, por um lado, o nome de um planeta e, por outro, o nome de um imperador romano.

O planeta Joviano é, no sistema solar, sinónimo do planeta Júpiter que, representa, como sabemos, a jovialidade e a felicidade. Com efeito, Júpiter, Joviano, é o maior planeta do sistema solar, o quinto a partir do Sol, com quatro grandes satélites descobertos em 1610 por Galileu: Ganímedes, Europa, Io e Calistes e a primeira ideia que dele temos é a de um planeta rodeado de uma série de anéis.

O imperador Flávio Joviano tem a particularidade de ter sido, um soldado posteriormente eleito, por força das circunstâncias, Imperador Romano pelo exército, em 26 de junho de 363, após a morte de Juliano que se envolvera numa batalha suicida. Dado que o exército romano se encontrava em território persa, Joviano viu-se forçado a celebrar a paz em termos, aparentemente, desfavoráveis, mas humanamente imprescindíveis para a sobrevivência das suas tropas. Só o grande espírito dialogante, conciliador e diplomático fez com que o exército romano conseguisse voltar a casa, são e salvo. Ao contrário do seu antecessor, apóstata, Joviano era cristão. É certo que Joviano só reinou oito meses, o tempo necessário para reconduzir o Império ao cristianismo. Joviano morreu em 17 de Fevereiro de 364, por razões para as quais alerto Joviano Vaz, nomeadamente, para a necessidade de contenção na comida, pois que o seu homólogo, tendo escapado à guerra, sucumbiu à ingestão excessiva de alimentos.

Partamos com estas duas simbologias à descoberta de Joviano Vaz, natural da ilha de S.Miguel há mais de setenta anos, tendo deixado as ilhas adjacentes como depreciativamente eram conhecidas as ilhas de bruma pelo regime de Salazar, em 1965 para rumar para Montreal, no Canadá, não propriamente para assistir à Expo que se realizaria dois anos depois e que viria a marcar esta metrópole norte-americana, mas para fugir da miséria material e política a que um regime obscurantista nos mergulhou a todos, uns mais do que outros e os Açores, muito particularmente.
Casado com a poetisa Amélia Oliveira-Vaz, de quem tem um filho, ela também oriunda de uma região votada pelo salazarismo, ao esquecimento e à pobreza extrema, província que também rosnou independência ou autonomia depois da revolução dos cravos: o Reino dos Algarves. Mais precisamente Lagos de onde partiu, igualmente, D. Sebastião “maravilha fatal da nossa idade”, não para se encontrar com Joviano Vaz, como a Amélia , mas para a infeliz aventura de Alcácer-Quibir.

Se tivermos em conta a vida do seu homónimo imperador romano não espanta que Joviano Vaz tenha sido um dos fundadores da Casa dos Açores do Quebeque, que dela se afastou, pois os valores espirituais que nele dominam primam sobre os valores temporais e jogos de poder para quais não mostra a mínima apetência. Neste sentido Joviano Vaz é um soldado do V Império profetizado por Bandarra, mais tarde desenvolvido por António Vieira e, mais recentemente, futurizado por Fernando Pessoa Império da Terra e na Terra (…) espiritual no governo, espiritual no uso, nas expressões e no exercício (…) Em qualquer tempo futuro será sempre espiritual. É com este espírito que Joviano Vaz se envolve com entusiasmo, dedicação e até serviço de missão em actividades culturais da Comunidade, abrindo janelas abertas que muitas vezes causam correntes de ar, colaborando assídua e persistentemente em tribunas de opinião (ou que deveriam sê-lo): o semanário A Voz de Portugal que quanto a nós muito empobreceu com a sua saída e a Rádio Centre-Vill que mais pobre ficará com a sua partida. O que vale é que temos uma comunidade tão rica e tão culta que se pode dar ao luxo de dispensar (ou mesmo hostilizar) pessoas da têmpera de Joviano Vaz, passe o cinismo desta afirmação.

Ordenado diácono da Igreja Católica, participa activamente nas manifestações religiosas da Comunidade montrealense (portuguesa e francófona). De Joviano Vaz, Osman traçou um retrato completo do homenageado (Ler apontamentos biográficos de Joviano Vaz por Osman Sarmento).

Joviano tem a mesma raiz da palavra jovialidade que significa bom humor, folgazão, alegria, engraçado, espirituoso, brincalhão, tudo epítetos que assentam como uma luva ao nosso feliz Joviano Vaz. E feliz porque, como já vimos, Joviano é influenciado por Júpiter, precisamente o símbolo da felicidade.

E a sua propensão para falar ao vento e pregar aos peixes, tantas vezes com voz de trovão, imponente, conjugada com um timbre melodioso convincente, foi-se desenvolvendo, semana a semana, com persistência na Rádio Centre-Ville: Os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem que fazer o que dizem. E insistia: Neste mundo há muitas misérias que não são ignorâncias, e não há ignorância que não seja miséria. E comentava, dirigindo-se aos sossegados, conformistas e palavrosos peixes falantes desta comunidade: Homens de “havemos de fazer" nunca farão nada. Estas palavras não são obviamente do Joviano Vaz, são do Padre António Vieira, cujos 400 anos do seu nascimento se comemoram igualmente este ano e, sabemos, é um dos autores mais admirados por Joviano Vaz, cujas ideias as frases citadas transmitem o que pensa. Se citei Vieira foi porque muito do pensamento Vieirino se instalou para sempre no pensamento de Joviano Vaz, traduzido nas seguintes palavras: Gostaria de apanhar o tempo presente e mudá-lo à minha maneira, Sem preconceitos,Sem dificuldades, Só mudá-lo. Nada mais. Talvez melhor soubessem dizê-lo Vieira ou Flávio Joviano, ora acontece, que estas últimas palavras saíram da pena do nosso homenageado.
Façam-me, no entanto, o favor de não dizer que comparei António Vieira a Joviano Vaz. Porque disso não se trata.

Permanentemente inquieto intelectualmente, Joviano Vaz questiona-se sobre as injustiças sociais e incoerências conceptuais, que assinala com zelo e revolta à maneira vieirina: Não me temo de Castela, temo-me desta canalha...

Tal como vieira que muitas vezes se retirou, desejamos que Joviano Vaz faça como o imperador da língua portuguesa, que outras tantas vezes, regressou ao futuro. Para já, ao que julgamos saber, vai fazer saltar da gaveta uma série de escritos para um livro que, esperamos, seja para breve, Porque primeiro se deve assegurar a conservação do próprio, e depois, se for conveniente, se poderá conquistar o alheio.